Nietzsche e a
Europa
Usura is a
murrain, usura blunteth the needle in the maid's hand
and stoppeth the psinner's cunning. Pietro Lombardo
came not by usura
Duccio came not by usura
nor Piero della Francesca; Zuan Bellin' not by usura
nor was 'La Calunnia' painted.
Came not by usura Angelico; came not Ambrogio Praedis,
Came no churc of cut stone
signed:
Adamo me fecit. |
A usura é
uma sarna, a usura / tornou romba a agulha na mão da donzela
/ e desfez a perícia da fiandeira. Pietro Lombardo / não
veio da usura / Duccio não veio da usura / nem Piero della
Francesca; Zuan Bellini não veio da usura / nem por ela
foi 'La Calunnia´ pintada. / Não veio Angelico da
usura; da usura não veio Ambrogio Praedis, / Nem nenhuma
igreja de pedra lavrada com a legenda: Adamo me fecit. |
Ezra
Pound - The Cantos - Canto XLV
25 de Agosto de 2000: Friedrich
Nietzsche, 100 anos após a sua morte. Nem uma única
ideia honesta, sequer uma ideia de jeito por toda a nossa Europa.
Peter Sloterdijk, um bem sucedido comediante do profissionalismo
filosófico alemão, falou do nome Nietzsche como
da "marca de uma droga literária de desenho"
e foi tão corajoso e original ao ponto de insistir que
entre e o pensamento do filósofo e a "pose da raça
superior" (ao falar de pose, o autor procurou demonstrar
aos seus compatriotas, os alemães, que também eles
são um povo que sabe fingir-se, e que, como tal, é
necessário apostar na comédia nacional. Todas as
vantagens, portanto, quer as catárticas quer as comerciais,
num só golpe! Genial!...) própria dos alemães
"durante a ditadura de Adolf Hitler" (o interregno
epocal, a forma política da representação
e condução da governação, o nome,
e o apelido, vêem por atacado), não existe qualquer
conexão. Assim se apazigua a visita do espectro convidando-o
a beber o chá no próprio salão onde os enlutados
proferem a orazione della bertuccia. Assim se adula a política
social-democrata dos educadores da Chancelaria. Fiquem os alemães
sossegados que logo os outros comerão por tabela. Além
do mais, Nietzsche é um óptimo produto de marketing,
como o prova, aliás, o apelativo e sugestivo título
da comemorável conferência de Sloterdijk... "Melhoras
da mensagem de felicidade: o super-homem de Nietzsche".
Manfried Riedel, certificadamente discípulo de Hans-Georg
Gadamer, assegura-nos que Nietzsche é para ser imediata
e definitivamente tomado e "tratado" como um sério
caso literário. Imagine-se o sucesso de uma tal proposta
para o ensino de Nietzsche e da língua alemã nas
escolas públicas alemãs e de Alemão?!...
Isto, claro, pressupondo que ninguém ousa questionar-lhe
a condecoração e a medalha, i.e., o lugar do Espírito
Santo na santíssima trindade Lutero, Goethe e Nietzsche.
Parece mesmo que há turísticos itinerários
de peregrinação para os "amantes do seu pensamento".
Roecken, Naumburg, Sils-Maria, Oberengadin, enfim, uma infinidade
de lugares igualmente apetecíveis. Por Herbert Frey, um
distinto filósofo austríaco, ficamos igualmente
a saber que Nietzsche é muito um fenómeno de imaginação
predominantemente francesa:"No espírito de Maio de
1968 estava o alento do filósofo", isto é,
a Révolution dos estudantes é um bocadinho nietzscheana.
Este filósofo austríaco Frey é um adepto
do eixo Paris-Berlim. Um senhor verdadeiramente digno de confiança
e absolutamente à prova de qualquer triunvirato de sábios...
Numa palavra, um autêntico diplomata, o cavalheiro!...
Mas, e em Portugal? Como foram os cem anos passados sobre a morte
do cabeça-de-dinamite (assim o chamava Ernst Jünger)
assinalados? Ora... com a pacatez e o provincianismo todo cosmopolita
e auto-satisfeito de um ou de dois press-releases devidamente
embrulhados na secção obituária das páginas
da Cultura dos nossos Diários. Falou-se na edição
das Obras Escolhidas "em bom tempo" levada a cabo pelo
Círculo de Leitores sob a "superior e avisada"
orientação de António Marques; registou-se
o facto de o livro Metafísica do Trágico. Estudos
sobre Nietzsche, de Nuno Nabais, haver ganho o Prémio
de Ensaio da Associação Portuguesa de Escritores;
enumeraram-se dois ou três livros como outros tantos estudos
dignos de menção e louvor e ficámos ainda
a saber que o próprio ex-ministro da cultura, Manuel Maria
Carrilho, lúcido e acérrimo defensor de uma coisa
chamada Perspectivismo (garantem-nos que é toda uma autêntica
e inovadora teoria do conhecimento), faz parte de uma "nova
geração de filósofos portugueses que não
deixaram de pensar Nietzsche". Ficou esquecida a publicação
de Escritos sobre Nietzsche, na Relógio D'Água,
do italiano Giorgio Colli, o qual, em conjunto com Mazzino Montinari,
deu à luz o que hoje passam por ser as Obras Completas
de Nietzsche e, por isso, a incontornável fonte e referência
de qualquer trabalho académico que se queira sério.
Mas, é claro, feito o cômputo, esta omissão
é coisa de somenos. Vil Europa! Pobre República
Portuguesa! Que já não conseguis ouvir...
DIE WÜSTE
WÄCHST: WEH DEM, DER WÜSTEN BIRGT
Ich Zweifler aber ziehe es in Zweifel,
Dafür komme ich
Aus Europa,
Das zweifelsüchtiger ist als Eheweiblichen.
Möge Gott es bessern!
Amen. |
O DESERTO CRESCE:
AI DE QUEM ABRIGA DESERTOS...
Eu, céptico, ponho-o, porém em dúvida,
porque eu venho
da Europa
Que é mais desconfiada que todas as mulheres casadas
Queira Deus melhorá-la!
Amen. |
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