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Outros
textos _ catarina moura
O hermetismo
e a singularidade da obra de Franz Kafka confirma-se em Os Aeroplanos
de Brescia e Outros Textos, um livro tardio, talvez o mais recente,
que reúne mais alguns fragmentos dispersos do labiríntico
universo kafkiano, que a morte prematura deixou eternamente incompleto.
O fluxo narrativo deste "estranho judeu checo", autor
de O Processo, A Metamorfose e América parece nascer do
ritmo assimétrico dos sonhos. Mas, embora possa associar-se
a escrita de Kafka à mecânica dos sonhos, a natureza
onírica da sua obra tem que ser procurada mais fundo.
Podemos dizer que Kafka incorre pelo território dos sonhos
porque a simbologia das suas palavras é um desafio áquele
que só acredita no que vê e toca. Não estando
no limitado território do possível como o concebemos,
a narrativa kafkiana é no entanto demasiado provida de
rigor e inevitabilidade para poder ser extraída da experiência
onírica comum. Kafka é lógico e coerente
na sua ilógica e incoerência. Contundente e frio,
objectivo e racional na sua irracionalidade.
Numa obra onde tudo é mistério, os símbolos
adoptados ainda não encontraram interpretação
satisfatória. Sabemos que, ao ler, podemos não
estar a ler o que ali está escrito. E inventamos, dissertamos,
erramos pelo seu labirinto sabendo a priori que não tem
fim, fascinados simultaneamente pela procura de sentido e pela
sua ausência.
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