Zero e ponto final
Por Anabela
Gradim
Ao sabor de sucessivas reformas,
paulatina mas imparavelmente, as notas dos estudantes do Ensino
Secundário têm vindo a subir, a inchar, a crescer
e é isso que explica que desde os anos 80 dupliquem as
vagas no Ensino Superior, mas as elevadas médias de acesso
se mantenham. Um optimista diria que estes estudantes são
melhores, mais cultos, mais preparados
mas não deve
ser verdade, pois também o insucesso e o abandono escolar
no Superior cresceu, como crescem já as pressões
para o "controlar".
Toda a gente sabe, também, que Portugal tem escolas com
a maioria do corpo docente contratado, e uma pequena parte, instalado.
Às vezes muitos são também deslocados. Ora
quando os jovens estudantes, descontentes com uma qualquer nota,
recorrem da mesma, tal implica, em Julho, mês quente e
solarengo, relatórios e reuniões, na escola, de
contratados, deslocados e instalados, por causa da nota, e do
tal recurso. E assim as notas sobem, e às vezes, em exames
nacionais e provas globais, descem. E isto serve para enquadrar
a gravidade do que se passou na Escola Martins Sarmento, em Guimarães,
onde mais de duas centenas de alunos, utilizando atestados médicos,
faltaram às provas globais do 10º e 11º ano,
com o aval de progenitores e docentes.
O que estes pais, e o Conselho Executivo da escola, estão
a ensinar a estes jovens adolescentes - que atravessam uma fase
da sua formação em que, precisamente, se consolidam
os valores que se manterão pela vida fora - é o
seguinte: não vale a pena combater um sistema de avaliação
eventualmente injusto, nem tentar alterá-lo. A hora é
de tirar proveito das falhas de um regulamento mal feito, e se
isso implicar ultrapassar pela direita milhares de outros adolescentes
que se submeteram a essas provas, tanto melhor. Mais chocante
ainda é o orgulho, e o despudor, com que um destes pais
admitia, em declarações a um jornal: 1. O facto
de aos atestados não corresponder nenhuma doença;
2. A legitimidade de os seus rebentos ultrapassarem através
do expediente milhares de jovens nas mesmas circunstâncias.
Que professores dessa escola, que têm por principal missão
educar, se associem a manobras deste tipo; e que um sindicato
do sector tenha vindo publicamente apoiar docentes e alunos,
diz tudo sobre a natureza do ensino que cada vez mais temos;
e sobre uma classe que se surpreende, e se queixa, com a falta
de respeito de pais e alunos, e com o crescente desprestígio
social a que está votada. Pudera! E, todos juntos, ainda
têm a lata, e o despudor, de vir publicamente clamar contra
o ministério que os obriga a repetir as provas. Eu acredito
que não. O médico, e os atestados, deviam ser minuciosa
e exaustivamente investigados, e nos casos em que se verificasse
serem falsos, os estudantes faltaram às provas voluntariamente,
e não lhes seria permitido repeti-las. Tinham zero, que
é o que merecem, e faziam média com esse número.
Passava-lhes imediatamente a razão, e podia ser que recuperassem
o bom senso e a vergonha.
Infelizmente, mesmo que o ministério não perca
totalmente a face, isso não vai suceder. Aprendem, assim,
os infantes, a modelar excelentes comportamentos de que poderão
fazer uso na sua futura vida pública. E nós contribuintes
regozijamos-nos porque os cursos superiores em universidades
públicas que vierem a tirar - Direito, Gestão,
Engenharia Civil, Economia - pagos pelos impostos de todos nós,
lhes serão certamente muito úteis. E a mais ninguém. |