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Pedro Guedes de Carvalho |
Versões
e as duas
faces da globalização
Numa destas manhãs tive a oportunidade
de observar uma notícia na CNN - 24 hours headlines -
onde um leque variado de artistas, editores e produtores musicais
se insurgiam contra a falta de protecção dos seus
direitos autorais, uma vez que as vendas de discos estavam a
diminuir abruptamente, de tal forma que deixava de ser estimulante
a criação musical. A principal causa dessa quebra
de vendas, diziam, prendia-se com a liberdade total de cópias
de CD's através da Internet. Fundamentava-se este argumento
com base em estatísticas que demonstravam que as lojas
que mais se ressentiam eram as que se localizavam nas imediações
de Campus universitários, local simultaneamente mais frequentado
pelos principais esperados consumidores.
Gostava de pegar neste assunto para o dissecar um pouco mais.
Com efeito existem aqui dois problemas: um, relacionado com o
efeito devastador e há muito esperado da globalização
da economia. Podem produzir-se bens e serviços num local
específico, mas os canais de distribuição
dos mesmos, sobretudo os que têm a sua expressão
na informação digital, ampliaram de forma rápida
e global os locais da sua aquisição; o outro problema
é da quase impraticável garantia dos direitos autorais,
que significa que o aumento do consumo dos referidos produtos
não se traduz directamente num aumento das mais valias
para os seus criadores. Ou seja, os dois lados da mesma moeda.
Os novos meios de comunicação e tecnológicos
aumentam as oportunidades de negócio, mas também
os democratizam ou seja, permitem que mais pessoas inicialmente
impedidas de produzir por falta de meios, coloquem a sua capacidade
criativa ao seu próprio serviço.
E sempre foi assim. Os verdadeiros ganhadores da economia não
são os que produzem os bens, cujo mérito ninguém
lhes pode tirar, mas sim os que conseguem encontrar as pessoas
que estão interessadas em adquirir um determinado tipo
de bem.
Os direitos de propriedade, as patentes, os registos serviram
durante muito tempo como intervenção do Estado
para protecção dos direitos de quem tinha feito
o investimento inicial. Este exemplo é a prova provada
que não vão continuar a ter essa função,
uma vez que, como também diziam alguns editores, o processo
é incontrolável, podendo-se fazer as cópias
destes artigos em qualquer lado do mundo por pessoas dificilmente
identificáveis. Os direitos de propriedade são
uma questão actual, mas de difícil solução
no caso dos bens de informação, dado que são
muito mais facilmente reprodutíveis que outros (um novo
tipo de liga metálica, um medicamento, um líquido,
etc).
Que tendência surgirá?
Os economistas Shapiro e Varian, que editaram recentemente um
excelente livro designado Information Rules, admitem que é
mais útil as empresas pensarem em fazer diferentes versões
de uma mesma informação , adaptando-a às
necessidades e ao diferente poder de compra dos segmentos de
procura, do que exigir do poder legislativo e dos tribunais a
protecção de direitos, que cada vez são
de mais difícil defesa, além de que se torna uma
actividade dispendiosa e morosa, com custos sociais não
compensadores.
Fácil, não é? Não será que
todos nós já tínhamos descoberto isto quando
percorremos qualquer uma das feiras do nosso país ou os
saldos das nossas melhores lojas comerciais? Há quem não
queira comprar cópias e se dispõe a pagar mais
para ter originais primeiro que os outros e adquirir status.
Mas os que apenas querem andar vestidos, calçados, ler
ou ouvir a música que gostam não têm também
esse direito?
Sugere-se por isso aos múltiplos autores que continuem
a criar, a compor, a escrever e entreguem a distribuição
a quem perceba do assunto, ou seja, de versioning. |
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