Todos culpados
É
impossível evitar
o assunto. A violência e a falta de autoridade na escola
são temas obrigatórios de conversa entre professores
e entre pais. O comportamento dos alunos preocupa todos quantos
se sentem responsáveis pelo futuro das novas gerações.
Ninguém encontra a solução que se impõe.
Uns ficam-se pela lamentação do costume, outros
atribuem culpas à sociedade.
E o problema não é só português. Aqui
também entra a globalização. Luc Ferry,
presidente desde 1993, do Conselho Nacional de Programas do Ministério
da Educação francês diz: "Hoje, os estudantes
questionam tudo. Quando um professor de francês lhes diz
"vamos ler Flaubert" se isso não lhes interessa,
rejeitam. Perante isto há duas atitudes: ou faz-se demagogia,
para agradar aos alunos, o que condeno, ou mantém-se autoritariamente
os programas. Esta atitude pode levar os estudantes a rejeitá-los,
pura e simplesmente. E observa: "Verifica-se em toda a Europa
uma falta de legitimidade, de autoridade, no sentido nobre do
termo, do que é ensinado na escola". Luc Ferry concretiza:
"A cultura dos adultos deixou de ter uma legitimidade evidente
para as crianças e os jovens".
Qual a solução? O presidente do Conselho Nacional
francês enfatiza: "O problema número um é
o da autoridade. Acontece com os professores o mesmo com os políticos.
Ambos têm um poder muito limitado: pelo exterior (globalização)
e pelo interior (media). Um ministro pode ser verdadeiramente
desestabilizado por um artigo de jornal. Preferia que os políticos
tivessem o direito de serem impopulares com tempo para aplicar
as reformas. Julgá-los-íamos depois. O tempo da
política é muito longo e o da vida mediática
muito curto". Eis um diagnóstico completo. Quem contém
elementos de reflexão a desafiar pais, professores, políticos
e agentes educativos. Elementos referidos por quem o saber é
de "experiência feito".
Sem o mínimo de autoridade, toda a educação
cai por terra. E não há formação
que se possa levar a bom termo. A educação vai
para além da simples instrução. Por isso,
importa ajudar as famílias a promover o desenvolvimento
dos filhos. Aos professores incumbe a tarefa, como anota Daniel
Sampaio, conhecido especialista, de saber detectar sinais de
alarme tais como as fugas de casa, o consumo de álcool
e drogas, o isolamento, as faltas às aulas, os maus resultados
escolares e a alteração do comportamento normal.
O professor deve funcionar como educador e não como mero
transmissor de conhecimentos.
Os valores surgem naturalmente na ordem das prioridades educativas.
O culto da verdade, o conceito e o uso correcto da liberdade,
a formação para a solidariedade, a descoberta das
razões de viver e a procura de um ideal constituem um
programa imprescindível para a sociedade de amanhã.
No Séc. XIX, já o filósofo americano John
Dewey, atribuía o fracasso da educação ao
facto de desprezar o princípio segundo o qual a escola
é uma forma de vida da comunidade. Hoje todos os agentes
educativos estão de acordo com este princípio.
A escola tem de ser uma aprendizagem para a vida em comum. De
outra forma, a sociedade pode orgulhar-se de super-intelectuais
mas pobres de valores humanos. E quem conhece ou se dá
ao trabalho de conhecer a escola?
Jacques Maritain, filósofo francês de renome, põe
em causa determinadas pedagogias que em vez de contribuirem para
a formação do homem, negam os objectivos da escola.
E aponta os sete fracassos dessas pedagogias. Em primeiro lugar
Maritain cita a ignorância dos fins da educação.
Nesta linha de pensamento, o segundo fracasso consiste em dar
o predomínio à ciência sobre a sabedoria.
O pragmatismo utilitarista que faz equivaler o útil ao
verdadeiro é o terceiro fracasso, segundo o filósofo.
O quarto chama-se sociologismo reducionista, pois converte a
educação em formação só de
cidadãos. O intelectualismo, ou seja equiparar a educação
à instrução com primazia do intelectual
sobre o espiritual, é, para Maritain, o quinto fracasso.
O sexto tem o nome de voluntarismo que apela ao irracionalismo.
E finalmente a informação que acumula dados e conhecimentos
em vez de formação que estimula a atitude crítica.
Contra estes sete fracassos, Maritain propõe uma educação
integral baseada no humanismo personalista. Note-se que, em face
dos desvarios que por aí pululam sobre a finalidade da
educação, especialistas modernos começam
a reconhecer que é necessário centrar toda a educação
na pessoa humana.
Para alcançarem este objectivo, os pais e os professores
não se devem demitir dos seus deveres e alienarem culpas
uns para os outros. Nem para a violência que passa na televisão
nem para o ambiente das escolas. É verdade que a violência
televisiva tem influência mas a imagem negativa da escola
é perniciosa.
Receitas mágicas não existem para resolver nenhum
problema. Mas se a autoridade falta em casa, se não se
ensinam na família boas maneiras, como impedir que um
aluno ponha os pés em cima da secretária do professor
ou agrida o próprio professor. E acabe a invocação
do clima social para justificar a consciência.
Todos somos culpados. Cada um, no sector que lhe compete, assuma
as suas responsabilidades. E não atribuamos ao 25 de Abril
culpas que não tem. A pergunta a fazer é esta:
que pais, que professores e educadores somos?
*NC / Urbi et Orbi |