Cegos mais apoiados com núcleo
da Beira Interior
Uma vida sem ver
POR DORA CONDE
O núcleo da Beira Interior da
ACAPO tem quatro anos. Nele reúnem-se cidadãos
invisuais que procuram um local de convívio e uma troca
de experiências de vida.
"Boa tarde. Quer comprar uma rifa? É para ajudar
a Acapo", repetia um senhor, manuseando um bloco de rifas
azuis. Esta era provavelmente a frase mais escutada por todos
aqueles que passavam no Pelourinho durante a semana passada.
A rifa dá acesso ao automóvel que a Associação
de Cegos e Amblíopes de Portugal(ACAPO) irá sortear
no próximo dia 31 de Maio.
Criada em 1989, a ACAPO, é uma associação
de apoio aos cegos que presta assistência material e cultural
a estes cidadãos.
Trata-se de uma associação com diversos núcleos
espalhados por todo o País, e também presente na
Covilhã. "Houve a necessidade de descentralizar a
associação para que todos pudessem usufruir dos
seus benefícios", afirma António Sardinha,
presidente do núcleo da Beira Interior da ACAPO.
E assim aconteceu. Há quatro anos, era inaugurado o núcleo
da Beira Interior daquela associação. O principal
objectivo deste núcleo passa por proporcionar aos cidadãos
invisuais de Castelo Branco, Guarda e Covilhã uma melhor
qualidade de vida. "A ACAPO fica assim mais próxima
dos seus sócios, especialmente para que os cegos possam
conviver e manter um relacionamento saudável".
Uma experiência de vida
António Sardinha faz parte
deste grupo de cidadãos. Quando nasceu, a sua visão
era já muito reduzida. Pouco tempo depois deixou definitivamente
ver. Hoje, com 57, anos é o actual presidente do núcleo
da Beira Interior da ACAPO. Para além deste cargo, trabalha
como telefonista numa empresa sediada na Covilhã. Ao todo
são 32 anos a receber e a efectuar chamadas. Uma tarefa
que para António Sardinha é simples de realizar.
"Criei a minha própria lista telefónica em
braille" refere.
Aquele responsável garante nunca ter sofrido de nenhum
tipo de discriminação no seu local de trabalho,
embora reconheça que "no meu tempo era mais fácil
as pessoas invisuais arranjarem trabalho". Quanto à
solidariedade da população da Covilhã em
relação aos cidadãos portadores desta deficiência,
António Sardinha garante que "quando vou para atravessar
a rua numa passadeira são poucas as vezes que a passo
sozinho".
Um amigo chamado bip
Para além do auxílio
que António Sardinha recebe das pessoas para atravessar
as ruas nas passadeiras, este invisual dispõe de outro
tipo de apoio - um bip. Este sistema de informação
sonora foi entregue no final do ano passado pela Câmara
Municipal da Covilhã a 11 invisuais da cidade.
Trata-se de um sistema que permite receber um sinal de aviso
quando um semáforo muda de cor, indicando que se pode
passar em segurança.
"Quando chegamos perto dos semáforos carregamos no
botão do bip e este dá-nos sinal de que foi accionado
o sensor do semáforo. Na altura em que o semáforo
passa a verde o bip volta a tocar" - explica.
A mudança de revestimento das passadeiras efectuada pela
Câmara contribuiu também para diminuir as dificuldades
sentidas por estes cidadãos no seu dia a dia. "As
passadeiras são agora de uma textura diferente, o que
nos permite localizá-las melhor", continua António
Sardinha.
Um núcleo activo
Com cerca de 70 sócios,
o núcleo da Beira Interior da ACAPO procura manter os
seus associados em permanente contacto. Para isso organiza diversas
actividades durante todo o ano. A lista é longa. "Temos
torneios de sueca e dominó a nível regional, um
magusto todos os anos, cursos de informática à
distância e também uma sessão de esclarecimento
sobre o Euro", salienta António Sardinha.
Os passeios também fazem parte das actividades do núcleo.
O último é já hoje, no feriado do 25 de
Abril, a uma escola de equitação. Para o mês
de Junho está também agendada a Taça de
Portugal de Gualball, que envolve cerca de 60 pessoas. "Para
este desporto são necessárias duas equipas e três
jogadores de cada lado", explica António Sardinha.
"O ringue está marcado com fitas para nos orientarmos
e cada equipa está junto da baliza para defender a bola
e depois atirá-la para o campo adversário."
Um desporto simples cuja bola emite sons de modo a ser localizada.
A natação é outro dos desportos praticados
com prazer por muitos.
Dificuldades
António Sardinha não
deixa de referir contudo as dificuldades pelas quais o núcleo
passa. "A maior ainda é a distância que nos
encontramos uns dos outros", diz aquele responsável
em relação aos sócios de Castelo Branco
e da Guarda. "Temos de os ir buscar para o Gualball, para
a natação e outras actividades" acresce António
Sardinha, que reconhece: "São os transportes que
nos ficam mais caros".
O presidente do núcleo da Beira Interior da ACAPO queixa-se
ainda da falta de apoio por parte do Estado. " A ACAPO é
uma entidade sem fins lucrativos e penso que não tem tido
da parte do Estado a atenção que merecia".
Apesar disso o núcleo conta com o apoio da Câmara
Municipal da Covilhã, do Instituto Português da
Juventude, do Clube de Montanhismo e de diversas Juntas de Freguesias
do concelho da Covilhã. De referir ainda a ajuda de alguns
voluntários que auxiliam os invisuais nos seus passeios
ou na leitura de um livro. |