E você, onde é que
estava...?
POR PEDRO JESUS
Nos últimos anos,
a pergunta "onde estava no dia 25 de Abril?" tornou-se
numa expressão sacramental, muito por culpa da popularidade
de um dos "bonecos" de Herman José. A expressão
passou a andar na boca de muitos, e quando colocada em tom coloquial,
pretendia levar à gargalhada fácil.
Risos à parte, fala-se aqui de homens e mulheres que viveram
intensamente o 25 de Abril na cidade da Covilhã - e noutros
pontos do País - e que mantêm ainda hoje, bem frescas,
as emoções vividas neste dia que se revelou simbólico
e inesquecível.
Maria de Jesus Bernardino, empregada de escritório:
"Recebi a notícia através da minha irmã,
que regressou da escola e me disse que tinha havido um golpe
de estado. Dirigi-me para o emprego e liguei logo o rádio,
onde só passavam marchas. Não trabalhei e fui juntar-me
às pessoas que ocupavam a praça do município
e aí emocionei-me ao ver as varandas da Câmara Municipal
totalmente ocupadas por populares. O ar começou a ser
mais leve no dia 25 de Abril e isso reflectiu-se no interior
das pessoas, que pareciam mais leves por poderem dizer o que
pensavam".
Dulce Pinheiro, 40 anos, professora:
" A minha primeira percepção do que viria
a ser o 25 de Abril começou logo pelas 8h30 quando me
dirigi ao refeitório da escola onde estudava. Quando ouvi
os 'matulões' do 7ºano comentarem 'Desta vez é
que foi!', tive nitidamente a sensação de que algo
de importante se estava a passar no País. A nível
estudantil, a adesão às manifestações
foi muito grande. O que se viveu foi indescritível!
Na altura residia em Caria e aí houve o que sucedeu em
todo o lado: mobilizações para a movimentação
cívica, lutas na rua e a uma alegria que saltava para
fora".
Francisco Prata Fortuna (ou Xico Moreira, como é mais
conhecido), 66 anos, reformado:
"O 25 de Abril apanhou-me de surpresa, já que
não esperava que fosse tão cedo; pouco antes tinha
participado numa reunião no Porto e mesmo aí não
se desconfiava que a revolução estivesse a um espaço
de apenas alguns dias. Estava a trabalhar desde as 6h30 da manhã
e assim que soubemos, parámos a fábrica e dirigi-me
com os restantes trabalhadores para a praça do Pelourinho,
que estava apinhada de trabalhadores vindos das outras fábricas
da cidade, e de muitas outras pessoas. Foi um dia fantástico
que mobilizou as pessoas de uma forma como nunca mais vi. Encheu-me
o coração e nunca mais esquecerei o pelourinho
completamente cheio de pessoas a gritarem 'Viva a liberdade'
".
Armando Morais, 54 anos, operário metalúrgico,
funcionário do Partido Comunista Português e responsável
pelo PCP no distrito de Castelo Branco:
"Em 1974 residia
na Amadora e tinha trabalho político em Lisboa. No dia
25 de Abril, assim que comecei a ouvir as notícias e as
músicas que passavam na rádio concluí que
se tinha dado um golpe militar progressista, já que na
altura também se falava de um hipotético golpe
de estado preparado pelos ultra-direitistas do regime. Passei
praticamente todo o dia nas ruas de Lisboa e permaneci junto
ao Campo Pequeno, na Avenida da Republica. Recordo com maior
precisão os tanques que passavam e traziam civis em cima.
Havia a ideia que algo de democrático estava a acontecer
e que se tratava do fim do imobilismo. A satisfação
era indescritível; vivia-se a esperança, a confiança
e a materialização dos desejos e dos sonhos. Pareceu-me
um salto para uma nova vida no país".
José Maria Cardona, 69 anos, reformado:
" Em 1974 era tecelão
e estava precisamente a trabalhar quando recebi a notícia.
Saí, e com o José António Pinho, andei com
um megafone a fazer alarde do 25 de Abril pela cidade da Covilhã.
Vivi os acontecimentos com euforia, ainda por cima devido ao
facto de ter consciência que o meu nome estava incluído
numa lista emitida pela polícia política e que
dizia respeito a quem seria futuramente preso e interrogado.
O 25 de Abril foi o melhor que nos poderia ter acontecido: antes
não havia liberdade, só opressão. Nem sequer
podíamos singrar na vida".
José António Gabriel Pinho, 60 anos, empresário:
"O 25 de Abril apanhou-me numa fase activa de luta contra
o regime. Acredito que era notório que o regime
estava preso por poucos dias: a Guerra Colonial afectava todos
os jovens e existiam ainda os problemas económicos e a
crise dos lanifícios. Tive conhecimento do que se estava
a passar em Lisboa bastante cedo. Nesse mesmo dia houve uma reunião
no gabinete do escritório do Dr. Antunes Ferreira, onde
se decidiu que Craveiro de Sousa, o presidente da Câmara
em exercício, seria destituído do cargo. Seguidamente
nomeou-se uma comissão administrativa para a Câmara
Municipal da Covilhã, que terá sido uma das primeiras
câmaras municipais do novo Portugal".
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