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Maria
Helena Vieira da Silva
Labirinto Urbano
POR CATARINA
MOURA |
Le metro
Quando, em 1956, o governo de Salazar
recusa a nacionalidade portuguesa ao suíço Arpad
Szenes, está a repudiar não só um grande
pintor mas também a impedir o regresso de Maria Helena
Vieira da Silva, sua esposa. Portugal era então um país
completamente impermeável à mudança e ao
progresso, e esta recusa é apenas um reflexo sintomático
desse fechamento. Este casal vanguardista e esclarecido destoaria
num País que o medo e a coacção mantinham
prisioneiros dentro dos horizontes restritos da ignorância.
Hoje podemos perceber que a importância que Vieira da Silva
viria a ter nunca seria possível se tivesse ficado em
Portugal. França foi a pátria adoptiva destes dois
pintores, a pátria que permitiu que a sua pintura e influência
circulassem por todo o mundo.
Deambulando entre a abstracção, o idealismo e a
sugestão do real, os quadros de Vieira da Silva oferecem-nos
a sua visão poética do espaço urbano, expondo
a complexidade da sua estrutura arquitectónica, à
qual oferece uma forte dimensão psicológica. Tornar
visível é, mais que saber olhar, poder exprimir.
Em cada tela está um espaço cujos elementos foram
percepcionados e não apenas observados. Ao olhar para
ele, Vieira da Silva absorve-o e, ao devolvê-lo, o que
ali está não é uma cópia desse espaço,
e sim esse mesmo espaço sugerindo mil outros espaços
diferentes, à medida do observador. Para ela, o que afecta
a pintura não é o desejo de copiar, mas de captar
a sua forma, cor, linha, textura, ... elementos mutáveis,
que cada observador digere de maneira diferente.
Contrariamente ao abstraccionismo bidimensional de Mondrian ou
Malevicth, a pintura de Vieira da Silva apresenta um elemento
inovador: a profundidade, ou uma ideia de profundidade, através
da fluidez das linhas geométricas que, aliadas à
ideia de transparência e a uma forte luminosidade, libertam
o espaço que representam. Bibliotecas, estações,
portos, edifícios, ruas perpendiculares, túneis
e corredores infindáveis, ... são temas recorrentes
da sua pintura labiríntica e vertiginosa, que nos conduz
invariavelmente ao urbano, a Lisboa e Paris.
Nascida em 1908, vinte anos depois entrega-se definitivamente
à pintura, evoluindo sempre, lenta e metodicamente, em
espiral, numa necessidade constante de maior rigor e verdade.
Espontaneamente, foi-se afastando de tudo o que pudesse distrair
e perturbar a harmonia do processo criativo. Fazendo o acto de
pintar uma forma de recolhimento e meditação, deixa
as grandes viagens do início da sua vida e isola-se no
seu atelier, ambiente conhecido, protegido, onde a memória
dos locais visitados deixa apenas uma estrutura, oca, que Vieira
da Silva preenche com o resultado de novas viagens, interiores,
e deposita na tela, como um tesouro generosamente partilhado.
Quando morreu, em 1992, deixou um vazio enorme e um legado de
importância incontestável à história
da arte do século XX. |
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