Raízes musicais dão
fruto na Covilhã
Uma viagem
ao Eterno Regresso
POR TELMA LOPES
Foram duas noites intensas
de sons que a cidade acolheu, num regresso ás mais antigas
raízes da música étnica e tradicional. Integrados
no programa do segundo Festival de Música Étnica
da Beira Interior, os concertos realizaram-se no campo de festas
da Covilhã, durante os dias 12 e 13 de Abril. O público
presente esteve em número abaixo das expectativas, mas
o suficiente para fazer a festa. Se foi dos muitos que não
assistiu, o melhor é não ler, para não saber
aquilo que perdeu.
Assumindo como principais objectivos
a caracterização e divulgação da
situação da música étnica/tradicional,
mantendo a sua memória viva e actual, a Associação
Académica da Universidade da Beira Interior (AAUBI), reservou
dois dias de concertos que decorreram durante a realização
do Festival étnico.
A AAUBI, em conjunto com a Câmara Municipal da Covilhã,
quis fazer com que este espectáculo pudesse incentivar
e sensibilizar as pessoas de um modo directo e participativo,
não deixando cair no esquecimento uma forma de expressão
artística que diz respeito a todos nós, nas suas
origens e identidades.
Com uma forte aposta na qualidade musica, a AAUBI pretendeu com
este evento defender, valorizar e impulsionar a música
étnica/tradicional tendo em conta toda a riqueza que esta
tem para oferecer.
A Associação Académica justifica ainda que
foi através da música que toda uma civilização
nos deixou as marcas da sua existência, o rascunho do nosso
passado, o nosso cariz mais próprio perpetuado nas nossas
raízes.
De facto, o ambiente vivido nestes concertos esteve muito perto
dos objectivos pretendidos, pois, reuniu grupos musicais que
apresentaram testemunhos interessantes daquilo que de melhor
tem a música tradicional portuguesa e estrangeira.
Uma Tenda de Emoções
O local inicialmente previsto
para a realização do espectáculo foi alterado.
Por motivos desconhecidos, mas que possivelmente se prenderam
com as surpresas que o tempo chuvoso tem feito nos últimos
dias, os concertos que supostamente se iriam realizar no Pelourinho
da cidade, foram transferidos para uma tenda situada no campo
de festas da Covilhã.
No primeiro dia, 12 de Abril, subiram ao palco os Pauliteiros
de Sendim, os At-Tambur e os Rumba Mayor. Por ordem de actuação,
a abertura do espectáculo foi feita, precisamente, pelos
Pauliteiros. Um grupo formado por uma associação
de professores, vindos de Miranda do Douro. Vestindo trajes semelhantes
aos gregos e romanos, os cerca de vinte elementos do grupo cantaram
em Português e Mirandês, fazendo-se acompanhar por
danças mistas e pelas famosas danças do pau. Habitantes
de uma zona muito fria no Inverno e muito quente no Verão,
este grupo diz "sentir uma responsabilidade de não
deixar acabar as danças, pois somos o único grupo
que ainda tem as danças mistas..."
Com um repertório tradicional europeu, e um esquema de
baile onde ensinaram as danças de um modo a que o público
pudesse participar, os At-Tambur foram o segundo grupo da noite
a entrar em palco. Recorreram a vários instrumentos, com
origens diversas, para a criação da sua música
que tanto agradou ao público presente. Mas aquilo que
realmente fez as delícias dos espectadores foi o facto
de poderem fazer parte do espectáculo. Formada uma roda
gigante, todos quiseram dar o seu passinho de dança..."
Já que a música e a dança estão inevitavelmente
interligadas, nós queremos um público participativo...
Não gostamos que os espectadores fiquem de braços
cruzados só a ver..." Afirma um dos elementos do
grupo.
O encerramento desta noite ( que a bem dizer já era madrugada)
coube aos Rumba Mayor. Um grupo de etnia cigana, vindo de França,
que apresentou as suas músicas em língua espanhola.
Entre Gaitas e Gaiteiros
No dia 13 de Abril, segundo e
último dia dedicado aos concertos, o público duplicou.
Cerca de cento e vinte pessoas encheram a tendinha, um pouco
mais encharcada do que no dia anterior, devido ao tempo chuvoso
que se fez sentir.
Pouco incomodado com a chuva, o grupo Folk Quest entrou em força
e apresentou um repertório cantado em Português,
Irlandês e Escocês. Trata-se de um grupo constituído
por cinco elementos e que, apesar da sua recente existência,
já actuou em alguns locais de bastante importância.
A sua última música foi a deixa para a entrada
dos Gaiteiros de Lisboa.
Actualmente são um dos melhores grupos portugueses na
área da nova música tradicional. Por esse facto,
foram distinguidos com o prémio José Afonso 98.
O projecto dos Gaiteiros, nascido em 1991, envolve um grupo de
músicos poli-instrumentistas com um longo percurso em
torno da música e dos instrumentos populares.
Este grupo procura novas sonoridades, e por isso." por vezes
dedico-me a inventar instrumentos com sons que não estejam
à venda" diz Carlos Guerreiro, um elemento do grupo.
A sua actuação foi o momento mais alto destes dois
dias de música tradicional. Tanto que o público
os fez regressar ao palco e, no momento da despedida, os saudou
com uma valente salva de palmas.
Apesar do espectáculo ficar aquém das expectativas,
em relação ao número de espectadores, o
balanço final foi considerado positivo. Sérgio
Novo, membro da Associação Académica, afirma
que "este ano quisemos apostar na formação
das pessoas e, no geral, elas interessaram-se por tudo o que
lhes oferecemos. Foram ver os filmes, as exposições,
os Workshops, e os concertos". E se nestes dois dias de
música, a quantidade de público ficou aquém
do que era esperado, o mesmo não se poderá dizer
em relação à qualidade. "Foram poucos
mas bons", garante quem assistiu.. |