A montanha mágica
Chega quando chega, mas chega
sempre. Desta vez foi a sério o nevão que na passada
semana esmagou de branco a Serra da Estrela. A sério e
inesperado. Durante três dias as estradas que atravessam
o Maciço Central estiveram encerradas ao trânsito,
reabrindo apenas na manhã da última quarta-feira,
quando as temperaturas na torre já rondavam uns amenos
zero graus. Todos os anos, mas neste com especial atraso, o tempo
lava mais branco os pecados desta terra. Vítima de turistas
de manta-e-garrafão que deixam para trás meio Continente
de detritos à passagem; de opções arquitectónicas
duvidosas; devastada por incêndios e incúrias várias,
são breves os momentos em que a serra volta a vestir-se
de primitiva magestade e grandeza. Iluminada de brancos-azul-gelo,
sacudida por ventos feroses, respira liberta enfim, e torna,
deserta e ameaçadora, a infundir o respeito que os homens
nunca lhe deviam ter perdido.
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