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António Lobo Antunes foi uma das figuras das letras portuguesas que os jornais franceses mais destacaram


Literatura portuguesa faz sucesso no Salão do Livro de Paris
O império do verbo

"Em fim de século, Portugal fundou o que talvez seja o seu quinto império - o do verbo" - profetiza assim o jornal francês "Le Figaro", rendido à embaixada literária portuguesa que encheu o Salão do Livro de Paris, inaugurado na passada Quinta-feira pelo Presidente da República portuguesa, Jorge Sampaio, e pelo anfitrião, Jaques Chirac.
A imprensa francesa rendeu-se efectivamente aos protagonistas das letras portuguesas. Em todos os títulos, sem excepção, dos matutinos ao vespertino "Le Monde", do católico "La Croix" ao comunista "L'Humanité", dos diários às revistas semanais, abundam os retratos da Lisboa pessoana, dos jovens autores que quebraram o tradicional pessimismo lusitano, dos consagrados, dos poetas, do feminino na literatura portuguesa.
Em suplemento literário, o "Le Fígaro" entrevista José Saramago, com honras de chamada à primeira página. Crítico, muito crítico do Portugal de hoje, o escritor há dois anos Nobel vê elevada a título a sua convicção de que "a mundialização é incompatível cokm os direitos do homem".
Do país que trocou pela ilha espanhola de Lanzarote diz que "a situação política, económica e social é a de um país onde parece que não houve revolução dos cravos". "É uma opinião politicamente incorrecta e difícil de digerir pelos estômagos bem pensantes, mas é a realidade".
Saramago dito por si próprio ocupa meia das três páginas que o suplemento dedica a Portugal e à meia centena que "em volta do seu Prémio Nobel testemunham uma literatura inventiva e poética, que evoca o império que se afasta, a imperiosa modernidade e a eterna saudade".

Uma cultura à aventura

No "Libération", com um especial de 16 páginas sobre o Salão do Livro, faz-se em três delas uma viagem a Portugal, com Vergílio Ferreira - "da minha língua vê-se o mar" - como guia. Por ordem alfabética, sintetizam-se Agustina Bessa-Luís, Ana Luísa Amaral, Lídia Jorge, Luísa Costa Gomes, Maria Gabriela Llansol (apesar de ausente em Paris), Miguel Torga, e Mia Couto.
A Lisboa dos eléctricos - "uma cidade estranha, que oscila entre a vida e a morte, entre as brumas e o sol, entre o isolamento e a abertura", assim olhada pelo "Le Fígaro" - está nas páginas reservadas pelo "L'Humanité" ao evento. O mote para oito páginas dá-o o ensaísta Eduardo Lourenço, em texto assinado sobre uma cultura que já não se revê no culto da melancolia ou do ressentimento contra si mesma. Uma cultura à aventura, ao mesmo tempo singular, europeia e universal.
António Lobo Antunes, "o romancista do delírio controlado", enche uma página retrospectiva da sua obra - acaba de ser lançado em francês "O livro das crónicas" -, da obra que o jornalista descreve como em ruptura com a ordem natural das coisas".
Timor-Leste tem voz neste jornal, por via da escrita de Luís Cardoso, o timorense autor de "Uma ilha ao longe", já possível de conhecer em língua gaulesa.
Lídia Jorge, concedorada quarta-feira pela ministra da Cultura francesa, é retratada como a mulher que murmura ao ouvido das ondas, numa parábola com um dos seus títulos - "A costa dos murmúrios".

Lobo Antunes: "o Nobel já
não tem importância para mim"

Quatro páginas dedica o católico "La Croix" à "eloquência harmoniosa" de Lisboa, a Saramago, "o romancista filósofo", a que Eduardo Lourenço emprestou - involuntariamente decerto - o rosto (a fotografia sai trocada), a Lobo Antunes, a Lídia Jorge, ao "contador africano" Mia Couto, ao "Flaubert português" Eça de Queirós.
Em seis páginas, "L'Express" evoca a "grandeza de Portugal", dos herdeiros de Camões e Pessoa que, não sendo tão conhecidos como os anglo-saxões, não têm motivos para alimentar invejas, animados que estão pelos novos ventos do pós-revolução.
Em entrevista, Lobo Antunes igual a si próprio - de crítica afiada, fala do Nobel e de como já não tem importância tê-lo visto passar. "Queria oferecê-lo à mãe dos meus filhos. Ela já o sonhava para mim quando tinha 16 anos e eu 20. Ela dizia - tu és um génio, tê-lo-ás. Mas morreu o ano passado e isso já não tem qualquer importância".
O "Courrier International" não fala de Lobo Antunes. Conta o "romance de uma nação", um romance ilustrado a toda a primeira página com a imagem colorida de uma típica traineira, e composto - no respeito, aliás, pela filosofia do jornal - da prosa de outros jornalistas, do Expresso, de O Independente, do Jornal de Letras e da Focus.

Les enfants térribles

O que é ser português motiva aqui as reflexões de Jacinto Lucas Pires, um dos jovens autores de quem mais se fala na imprensa francesa. Texto inédito de quem nasceu a 25 de Abril de 1974. "Atlânticos e mediterrânicos, continentais e quase insulares, tão longe do coração da Europa, somos um país que se cala, um país de poetas. Somos o oceano e a ribeira. Um rio à beira-mar." "Somos pequenos, mas pequenos da nossa ex-grandeza, e vivemos cativos dos nossos brandos costumes". "Somos os mais secretos dos europeus". "Somos, com certeza, aquela famosa e intraduzível palavra saudade".
Dos "enfants térribles" como Jacinto Lucas Pires e Pedro Rosa Mendes - outros dos jovens autores elevados ao estrelato pela imprensa francesa - se ocupa o "Nouvel Observateur". Os que "não cultivam o pessimismo como Pessoa, preferem a música tecno ao fado, inspiram-se mais na América do que em França e vendem-se na FNAC em Lisboa".
Ao institucional que este evento envolve só o "Le Monde" se reporta. Entrevista o ministro da Cultura, Manuel Maria Carrilho, sobre o preço fixo do livro, o peso que a língua francesa perdeu em Portugal.
Tinha razão Eduardo Prado Coelho, o comissário-geral da presença portuguesa, quando dizia à agência Lusa, ainda em Lisboa, que as Letras
portuguesas se encontram em todos, mas todos, os jornais franceses.






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