"Ninguém olha a lua da tarde, e é exactamente
naquele momento que ela teria maior necessidade do nosso interesse,
dado que a sua existência não está ainda
assegurada. é uma sombra esbranquiçada que desponta
do azul intenso de um céu carregado de luz solar; quem
nos garante que conseguirá, uma vez mais, tomar forma
e ganhar brilho? É tão frágil e pálida
e franzina; só um dos seus lados começa agora a
conquistar um contorno, claro como um arco de foice, o resto
permanece ainda embebido de azul celeste. É como uma hóstia
transparente, ou como uma pastilha semi dissolvida; só
que aqui o círculo branco não se está a
dissolver, mas sim a concentrar-se, agregando-se à custa
de manchas e sombras cinzento-azuladas, que não se percebe
se pertencem à superfície lunar ou se são
restos de baba do céu, que todavia impregnam o satélite,
poroso como uma esponja."
Italo Calvino, Palomar, Editorial
Teorema, 1985 |