Calendário escolar e não
só
Ao contrário de algumas opiniões expressas na academia,
de que o novo calendário escolar seria bom para as Ciências
Exactas e de Engenharia, mas mau para as Ciências Sociais
e Humanas, a minha opinião é de que o novo calendário
escolar não é nada adequado para as Ciências
Exactas, nem tão pouco, no meu entender, para as Engenharias.
O documento produzido pela comissão
ad-hoc diz sobre o calendário escolar:
"A filosofia do novo calendário escolar e da sua
organização visam a melhoria do sucesso escolar,
da continuidade dos períodos lectivos e da sequencialidade
de exames"
Nesta altura devo confessar a minha ignorância porque não
entendo bem o que esta frase significa, salvaguardando a parte
do sucesso escolar, que no meu entender será agravado
com este calendário. A parte da sequencialidade das aulas
e exames deve ser a que faz com que o primeiro semestre do primeiro
ano tenha apenas 9 semanas lectivas, se não existirem
feriados, e que não medeie nenhum espaço entre
a realização de exames do primeiro semestre e o
inicio do segundo semestre.
Quando se analisa em pormenor o novo calendário escolar
constata-se que o único feito conseguido é o aumento
do período de exames, que corresponde a uma reivindicação
antiga dos senhores estudantes. O período de exames passará
a ser de 44 dias por semestre, comparado os 75 dias de aulas
por semestre parece-me que existe uma proporção
inaceitável de quase dois para um. Mas analisemos as
consequências
práticas deste calendário.
Consideremos um aluno médio da Universidade da Beira Interior
que não goste de ir às aulas e pensa que se tivesse
uma semana para estudar para um qualquer exame conseguia alcançar
os 10 valores, nota que, incompreensivelmente, satisfaz muitos
estudantes. Infelizmente este é o comportamento típico
de uma grande maioria dos estudantes de Engenharia.
Perante este novo calendário este aluno escolherá
duas disciplinas para fazer por frequência, provavelmente
aquelas que lhe forem mais favoráveis nos critérios
de frequência, desprezará por completo as outras
três durante o período lectivo, pensando que após
o final das aulas disporá entre 15 a 21 dias para estudar
duas disciplinas, que pretenderá fazer em época
normal, após a qual disporá de um mínimo
de 15 dias para estudar a última disciplina que pretenderá
fazer na época de recurso, supondo a média de 5
disciplinas por semestre.
Conhecendo desde há quase 10 anos o tipo de raciocínio
dos estudantes de engenharia no que diz respeito à preparação
para exame, direi que este calendário escolar parece ser
a resposta a todas as suas reivindicações. Contudo,
contrariamente ao que os senhores estudantes parecem pensar,
uma semana, duas semanas ou mesmo três semanas não
são suficientes para um aluno médio estudar uma
disciplina cuja assistência às aulas desprezou por
completo, a não ser que a disciplina seja leccionada com
padrões abaixo dos mínimos exigidos numa Universidade.
Concluindo, o que este calendário incentiva é o
estudo nas semanas anteriores aos exames e não o estudo
sequencial da matérias.
Nesta altura os autores do acima mencionado documento apontarão
o ponto 7.1 que diz:
"O ensino aprendizagem deve ser fortalecido, durante o período
lectivo, com incentivos à presença nas aulas (assiduidade)".
Antes de mais há que realçar que este ponto é
um claro retrocesso a um documento anterior sobre promoção
do sucesso escolar que exortava os professores a não concederem
frequência a alunos que ultrapassassem um número
máximo de faltas. No entanto, este ponto vem ao encontro
de uma prática aplicada por vários docentes, e
que pelos vistos se quer institucionalizar, que bonificam os
alunos com um valor, dois valores, três valores, quatro
valores ou cinco valores pela simples presença nas aulas.
Caros senhores professores isso nem no Ensino Secundário.
A presença nas aulas é um direito e um dever de
todos os estudantes legalmente inscritos. Eventualmente os estudantes
podem abdicar desse direito e, se o professor o permitir, podem
mesmo não cumprir esse dever, fazem-no, contudo, por sua
conta e risco, que na maioria dos casos resulta na reprovação.
Está-se a evoluir para a situação em que
os professores irão disputar o máximo de bónus
a conceder pela simples presença nas aulas. Talvez cheguemos
à situação em que os alunos que assistem
às aulas têm automaticamente 10 valores, e porque
não 12, 13, 14 e por aí adiante. É que a
fazer fé nas palavras dos alunos que fazem eco junto a
alguns docentes, que deveriam ter mais consciência do seu
papel de educadores, se os alunos não comparecem nas aulas
é porque o docente é antiquado, chato, maçador
e, pior, não promove um relacionamento saudável
com os senhores estudantes. Neste ponto gostaria de recomendar
a leitura do artigo de Jonh Churchil publicado no Sunday Times
a 6 de Fevereiro do corrente ano.
Resta focar a seguinte questão: porque é o novo
calendário escolar é mais apetecível para
os estudantes de Engenharia do que para os estudantes das Ciências
Sociais e Humanas. Alguns estudantes de Ciências Exactas
e de Engenharia costumam falar com certo desdém dos cursos
das áreas das Ciências Sociais e Humanas: "...são
cursos sem matemática..., cursos que se fazem com um fim
de semana de estudo...". Contudo, na prática verifica-se
que a assiduidade às aulas é mais elevada nos cursos
das áreas das Ciências Sociais e Humanas do que
nos cursos de Engenharia. Os estudantes dessas áreas não
pretendem fazer o curso num fim de semana, pretendem fazê-lo
às Segundas, Terças, Quartas, Quintas e Sextas,
ao longo de todo o período lectivo, enquanto que os estudantes
das Ciências Exactas e das Engenharias, com o argumento
que os cursos e matérias são mais difíceis,
querem fazer o curso estudando apenas nas semanas anteriores
aos exames. Paradoxo que gostaria que me explicassem.
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