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Pedro
Homero |
A Eco-mentira da (S)hell
A companhia petrolífera Royal/Dutch Shell (mais conhecida
como Shell) organiza todos os anos um evento denominado Shell
Eco-Marathon destinado a promover a imagem da empresa no que
concerne a supostas preocupações ambientais. O
primeiro prémio vai para o carro que conseguir percorrer
o maior percurso possível com apenas um litro de gasolina.
Tal evento parece, à partida, merecedor de elogios. Afinal
de contas a companhia procura, com este evento, patrocinar o
avanço tecnológico destinado a melhorar o ambiente
do planeta - ou pelo menos a não piorá-lo.
O problema surge, como aliás acontece com muitas multinacionais,
na duplicidade das intenções da Shell - se por
um lado promove este tipo de acção, por outro é
responsável por atentados contra os direitos humanos e
contra o ambiente que revelam a verdadeira face por trás
da cosmética da maratona.
Desde 1958 que a Shell (uma amálgama de mais de 1700 companhias)
extrai petróleo da Nigéria. O total em dólares
monta já a mais de 30 biliões. Da totalidade, 80%
do petróleo provém do delta do Níger, que,
devido à exploração petrolífera,
já há muito se tornou irremediavelmente arruinado.
Este delta é considerado pelas Nações Unidas
como o mais ameaçado do mundo. No periodo entre 1976 e
1991 ocorreram 2976 derrames de petróleo na área
- os derrames dos anos 70 montam a 4 vezes o caso célebre
do petroleiro Exxon Valdez.
A região do delta é habitada por muitas minorias,
incluindo os Ogoni, cujas terras foram as mais massacradas pela
invasão da Shell.
Após uma onda gigantesca de protesto do povo Ogoni em
1993 contra a devastação ambiental provocada pela
empresa anglo-holandesa e os ataques ao direitos humanos perpetrados
pela ditadura militar nigeriana, a Shell viu-se obrigada a cessar
as suas operações no terreno. Contudo não
houve um trabalho de recuperação da área
adequado - na realidade as plataformas foram pura e simplesmente
abandonadas, deixando os Ogoni a braços com fugas de petróleo,
fogos e rebentamentos de "pipelines" que pioraram ainda
mais os problemas ambientais. Isto de uma companhia que tenta
mostrar ser tão amiga do ambiente.
O pior no entanto está ainda por contar. Metade dos rendimentos
do Estado Nigeriano, uma ditadura militar brutal comandada pelo
General Abacha, provêm da Shell, tornando esta empresa
a maior patrocinadora, (literalmente), do regime nigeriano.
Quando os Ogoni começaram a clamar por justiça
ambiental, os militares atacaram aldeias, mataram elementos da
população e executaram 9 activistas, incluindo
o líder Ogoni Ken Saro-Wiwa, nomeado para Nobel da paz,
em tribunal militar. Tudo isto com os protestos da comunidade
internacional, incluindo vários chefes de estado como
o próprio Clinton, e com a indiferença da Shell,
que só à última da hora, e após pressão
internacional, enviou um comunicado tímido pedido clemência
para Saro-Wiwa.
Tanto a Shell como o governo nigeriano admitem que a empresa
contribui financeiramente os militares na região. Sob
a desculpa de "proteger" a Shell de manifestantes pacíficos
na aldeia de Umeuchem, a polícia matou 80 pessoas, destruindo
casas e colheitas vitais em 1990. A multinacional admite que
pagou duas vezes aos militares para irem a aldeias específicas.
Apesar de alegarem que o objectivo era calar a dissidência,
ambas resultaram em mortes. A empresa admitiu também a
compra de armas para a força policial.
Uma das maiores provas, no entanto, provém de um memorando
secreto da "Task Force de Segurança Interna",
a foça militar destacada na região, onde o seu
chefe afirma que "é impossível a continuação
das operações da Shell a menos que seja efectuadas
operações militares".
Com tudo isto, é pena que a UBI se associe a um evento
promovido por tal empresa. Ironicamente ou não, o povo
que dá nome ao carro ubiano, "maubere", também
sofreu nas mãos da Shell devido ao papel desta na manutenção
da ditadura indonésia em Timor.
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