O encerramento dos lagares prejudica gravemente muitas
famílias do mundo rural
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Devido ao não tratamento das águas ruças
Lagares de azeite podem encerrar
Medidas de protecção ambiental podem obrigar
José António Martins Jorge, lagareiro na freguesia de Valverde, a
fechar o seu lagar. A produção de azeite no distrito está ameaçada
A partir do dia 31 de Março, vários lagares de azeite no distrito de
Castelo Branco correm o risco de serem obrigados a encerrar. Em causa
está uma deliberação do Ministério do Ambiente, em consonância com
directivas da União Europeia, que impõe o tratamento das águas
residuais dos lagares resultantes da produção de azeite.
José António Martins Jorge, 46 anos, membro da Associação de
Olivicultores do Fundão, é dono de um lagar que está na posse da sua
família há mais de 50 anos, na localidade de Valverde, concelho do
Fundão. Reconhecido pelo Instituto Nacional de Intervenção e Garantia
Agrícola, o seu equipamento apenas labora entre 40 a 50 dias por ano e
esmaga, em média, 10 toneladas por dia. Este proprietário concorda com
a legislação que se pretende implantar, no entanto, refere que, em
relação ao seu caso, não é economicamente rentável a construção
de uma Estação de Tratamento de Águas Residuais (ETAR), junto ao seu
lagar, que garanta o tratamento das águas ruças.
O seu equipamento, de pequena dimensão tal como a maioria dos
existentes na Beira Interior, não trata os resíduos, excedentes da
produção olivicola. "Faz-se como há 50 anos, as águas vão para
uma ribeira", afirma. E explica porque é que, na sua opinião, a
sua produção não justifica o investimento: "Não é rentável
fazer uma estação só para mim. Tem um custo demasiado elevado para o
movimento". A acrescentar a este argumento, António Jorge
considera que a actual legislação é muito penalizadora para com os
lagareiros: "Os maiores poluentes dos rios não são os lagares,
são, por exemplo, as oficinas de lavagem e mudança de óleos".
Fundos comunitários são insuficientes
Confrontados com este quadro negro, que vai
prejudicar um sector que constitui, em muitos casos, a principal fonte
económica de algumas famílias no mundo rural, a António Jorge, tal
como a outros lagareiros, resta-lhes uma saída que pode constituir a
sua "tábua de salvação": concorrer à atribuição de
verbas do III Quadro Comunitário de Apoio. Porém, os fundos
comunitários, que tentam assegurar a adaptação ambiental e a
renovação das estruturas da produção de azeite, são insuficientes.
Tendo em conta que o investimento necessário para a construção de uma
pequena estação de tratamento, ascende a quase 25 mil contos, muitos
proprietários não possuem capacidade financeira para suportarem, pelo
menos, 50 por cento deste valor, que corresponde à parte não
comparticipada.
Pedro Miguel Canaveira Fiães, vice-presidente da Associação de
Produtores de Azeite da Beira Interior (APABI), criada já durante este
ano, e director da Associação de Agricultores de Castelo Branco,
propõe para solucionar o problema que os efluentes sejam tratados
"de uma forma integrada". Deste modo, o tratamento da
poluição resultante da produção de azeite, seria feito em conjunto
com o tratamento dos resíduos urbanos. No entanto, a escassez de ETARs
no distrito constitui um sério obstáculo à concretização desta
medida. Em alguns concelhos do distrito de Castelo Branco, como por
exemplo o do Fundão, que inclui a freguesia de Valverde, não existe
nenhuma estrutura semelhante. Situação que leva aquele vice-presidente
a colocar a seguinte questão: "Se no Fundão não existe uma
estação de tratamento de resíduos sólidos, como os vamos tratar
?".
Recolha ao domicilio como alternativa
António Jorge e Pedro Fiães coincidem na solução a apresentar aos
responsáveis do Ministério do Ambiente para resolver o problema.
Segundo eles, a alternativa à construção de ETARs, nos locais onde
não seja possível efectuar o investimento, pode passar pelo transporte
das águas residuais até uma empresa especializada no seu tratamento. A
recolha das águas ruças, tal como já ocorre na vizinha Espanha,
seria, em principio, assegurada por camiões cisterna. Cada
proprietário pagaria posteriormente uma taxa pelo serviço.
Esta proposta, depois de apresentada por algumas associações de
agricultores, ainda não foi analisada pelos responsáveis dos
Ministérios do Ambiente e da Agricultura. Para já, os lagareiros
acreditam numa prorrogação do prazo depois de 31 de Março como forma
de evitar o encerramento dos seus lagares, ou o pagamento de pesadas
multas no caso de decidirem continuarem a laborarem, apesar do
incumprimento da legislação.
PCP acusa Guterres e Sócrates de serem os
principais responsáveis
Sobre esta matéria, a Direcção da Organização Regional de Castelo
Branco do Partido Comunista (PCP), divulgou uma nota distribuída à
imprensa na qual mostra o seu receio pelo que considera ser uma
"grave situação decorrente das orientações do Ministério da
Agricultura e do Ambiente". No comunicado, manifestam,
publicamente, a sua solidariedade aos agricultores e produtores de
azeite. Acusam, por outro lado, o Primeiro Ministro, António Guterres,
e o ministro José Sócrates de serem os principais responsáveis pelo
provável encerramento de dezenas de lagares. Segundo o partido
comunista, a medida, que poderá prejudicar a produção do azeite em
todo o distrito, "é reveladora da grande irresponsabilidade e
demonstrativa da total insensibilidade aos problemas e apelos do
movimento associativo do sector e dos agricultores da nossa
região".
Exclusivo Urbi et Orbi/NC
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