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Hubert Laurioz
Dicionário de
Superstições, Origens, Símbolos, Segredos
Se a maioria dos cidadãos das sociedades modernas e
tidas por esclarecidas não se considera por princípio supersticiosa, a
verdade é que por atavismo cultural, pela via de crenças diversas ou
por um inadequado conceito do sagrado, acaba por obedecer, ainda que
inconscientemente, a temores irracionais e atitudes ancestrais, muitos
deles transmitidos de geração em geração. Deste modo, a origem das
práticas supersticiosas - destinadas a propiciar a felicidade, o amor,
a saúde e a riqueza ou a evitar os seus reveses - perde-se no tempo,
embora continuem a fazer parte integrante da cultura de massas da
modernidade, que viu também proliferar, como nunca e noutros moldes,
fetichismos vários, hábitos irracionais e crenças securitárias.
Para Hubert Laurioz, autor deste
dicionário, as práticas supersticiosas não seriam inteiramente
absurdas, ainda que muitas delas sejam provenientes da pura
irracionalidade, fantasia ou delírio, o que as tornaria de qualquer
modo significativas do ponto de vista psicológico. Não deveriam, pois,
ser analisadas como objectos de estudo (i)lógicos ou reduzidas ao
sorriso ou à consternação dos que se julgam invulneráveis a elas,
tanto mais que a chancela de «superstição» tem sido usada desde
sempre em múltiplos contextos. Basta recordar que historicamente os
vencedores, assim como a sua cultura dominante, raramente deixaram de
considerar a cultura e os valores dos vencidos como pertencendo ao domínio
das superstições, como aconteceu na época da expansão colonial dos
europeus e até mesmo nos primórdios da investigação etno-antropológica
iniciada por estes no século XIX. Por outro lado, mesmo os que dizem não
ser supersticiosos e não acreditarem por princípio nos «azares»
convocados pelo número 13, por um gato preto que cruza o seu caminho,
pelo partir de espelhos, pelo passar por baixo de uma escada ou por
abrir um guarda-chuva dentro de casa, não deixam de ter manias,
caprichos e hábitos que são do domínio da superstição, do medo
irracional de serem mal sucedidos ou de se sentirem ameaçados. Enfim,
comportamentos, quantas vezes assumidos como lógicos, mas que têm
apenas como finalidade exorcizar, dir-se-ia magicamente, o medo e a
insegurança na sua esfera pessoal. Talvez por isso, mesmo se não
admitidos, os comportamentos supersticiosos são tão comuns e tão
enraizadamente inconscientes, ninguém estando imune a eles.
Laurioz, neste Dicionário de
Superstições
, fez sem dúvida um excelente trabalho de investigação, pois não se
limita a coligir banalidades, optando por conferir uma inteligente e
ampla perspectiva cultural e histórica à perenidade dos comportamentos
supersticiosos, descobrindo-lhes os códigos e remetendo-os para uma
forma de pensamento original, que obedeceria, segundo ele, «a um plano
razoavelmente elaborado de correspondências: a origem e o sentido
escapam-nos, porque os esquecemos, mas persiste a poesia subtil e
misteriosa das suas associações.»
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