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"Na Desportiva do Fundão aplico conhecimentos com origem em investigações na UBI"
Rodolfo Pinto Silva · quarta, 12 de novembro de 2014 · @@y8Xxv Bruno Travassos, docente da UBI, assumiu o comando da equipa fundanense que disputa a 1ª Divisão Nacional de Futsal. Em entrevista, fala do desafio e da formação de atletas na região. |
Bruno Travassos substituiu Pedro Henriques no banco da Desportiva do Fundão |
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Assumiu no último mês o comando da equipa sénior de futsal da Associação Desportiva do Fundão (ADF). Estava à espera deste convite? Não é que não estivesse de todo à espera do convite ou da possibilidade de, num futuro próximo, treinar uma equipa. Para além da actividade de docente na Universidade da Beira Interior (UBI), sempre estive ligado ao treino. Tenho tido contribuições nesse sentido e com o recente lançamento do livro que publiquei sobre a tomada de decisão no futsal também se abriram novas portas. Portanto, foi com expectativa que recebi esta possibilidade, que me agradou, porque posso colocar em prática muitos dos conhecimentos que resultam de investigações dos últimos anos. Encarei-o como um desafio – mais um como têm sido tantos outros na minha vida –, mas este com uma maior visibilidade.
A Desportiva do Fundão é uma equipa que conhece bastante bem e a proximidade com a UBI, de alguma forma, também ajudaram a aceitar o convite? A proximidade entre as instituições e do local de residência foi um motivo que ajudou a que esta relação se iniciasse. Já tinham existido propostas de outras zonas do País, que nunca tinham andado para a frente por causa desta dificuldade na deslocação. Além disso, conhecer a realidade do clube, das ambições e também do modo como a coletividade vive a modalidade, foram fatores decisivos para o convite que me foi feito.
Na última época a ADF teve a melhor temporada de sempre. Venceu a Taça de Portugal e ficou em segundo no campeonato. Que expectativas é que podem existir até ao final da época, que ainda está numa fase inicial? A ADF é uma referência no panorama nacional. A seguir ao Benfica e ao Sporting, é a equipa com maiores responsabilidades. No entanto, muita coisa se passou neste pouco tempo. Apesar dos feitos que foram atingidos na época passada, não podemos dizer que vamos fazer igual ou melhor. Neste momento, estamos a arrumar a casa e a pôr as nossas ideias em prática para procurarmos consolidar processos, para que a Desportiva volte a ser uma equipa que joga com a mesma ambição e com a mesma determinação que tinha no passado. Esperamos que ao alcançar esses processos consigamos mais rapidamente chegar ao patamar que pretendemos em termos de vitórias, que no futuro nos poderão levar a alcançar novos êxitos, que esperamos e também ambicionamos.
Acontece com frequência haver equipas que conseguem fazer uma boa época e, na seguinte, descem bastante ao nível dos resultados. Dentro do clube e do plantel há o receio de que possa ter sido uma época excepcional e que a equipa não se consiga manter no topo? Penso que não. Os jogadores têm noção de que aquilo que fizeram foi algo de extraordinário. Mas também sabem que houve coisas que mudaram e da qualidade que têm face ao campeonato em que se encontram. Mais do que temer o salto abrupto no sentido negativo, eles querem sobretudo consolidar processos e sentir-se confortáveis naquilo que é a forma de jogar deles e do clube. Nomeadamente os atletas que já estão há mais anos na ADF, que têm sempre mais expectativas em relação às novas épocas, porque vêm de um processo de formação de oito ou nove anos. Neste momento era isso que eles estavam a sentir falta: de voltar a ter consolidação nos processos de jogo, confiança naquilo que faziam e confiança em si próprios. Mais do que temer os factores negativos ou a não organização do clube para se tornar sustentável, o que me parece é que eles temiam alguma desagregação face a uma menor identificação com forma de jogar que estava a ser implantada nos últimos tempos.
Em termos de estruturas e de solidez do projeto, tendo em conta que é a única equipa de futebol que disputa um campeonato principal, que sustentabilidade é que vê no clube? Em termos directivos, o clube está estável. Financeiramente também me parece que conseguiu encontrar a sua estabilidade em termos de sponsors e ajudas da região. Aquilo que o clube necessitava mais é de uma maior capacidade agregadora com esta zona. O clube foi vice-campeão nacional, é detentor da Taça de Portugal e, por vezes, parece que existe um divórcio entre o próprio clube, a equipa e a região. Não porque a equipa o queira, porque nós pretendemos ser a bandeira da região, mas muitas vezes ainda temos pouca gente a assistir aos jogos. Esse é um problema que enfrentamos, porque é fundamental criar também um clima de motivação à volta das pessoas, que as ajudem a ir ao pavilhão e a gostar da modalidade e que, por sua vez, nos ajudem quando estamos dentro do campo a galvanizar-nos e a estarmos mais motivados para levar mais longe o nome do Fundão e da Cova da Beira.
Na linha desta ligação com a região contribuiria certamente ter atletas locais a jogar na equipa. Como é que vê a formação dos clubes como especialista nesta matéria? Tenho-me deparado com esse problema há vários anos e tem sido discutido com outras pessoas. O problema da integração de jogadores locais na primeira equipa da Desportiva passa pela competitividade a que os jogadores estão habituados, quando passam do escalão de juniores, onde jogam sobretudo o Distrital, e ascendem a um patamar de primeira divisão. E o salto é enorme. Existe logo uma diferença quando passam de júnior para sénior. Subir de júnior de distrital para sénior de primeira divisão é um choque muito grande ao nível do número de treinos, da intensidade e do compromisso que tem de haver por parte dos jogadores. Nós vivemos numa região que, ao contrário de algumas que têm um grande número de clubes e de pessoas a praticar, tem uma reduzida taxa de participação na formação. Esta falta de equipas num distrito tão grande faz com que haja falta de competitividade e que, muitas vezes, os praticantes cheguem ao escalão sénior sem estarem preparados para aquilo que é a realidade desse campeonato. Que é que nós estamos a fazer e que já vinha sendo feito ao longo dos últimos tempos? Há juniores da Desportiva do Fundão que estão a trabalhar com a equipa sénior, duas a três vezes por semana. É a forma de os irmos integrando, procurando dar mais competitividade e volume de treino para que eles possam estar preparados para que daqui a dois três anos sejam opções para o treinador.
Uma coisa é a preparação, outra é o talento. Ele existe nos jogadores locais? As pessoas nascem com uma predisposição “para”, mas o talento constrói-se. E se não houver condições contextuais, ambientais e sociais que permitam o desenvolvimento desse talento, fica mais difícil. É curioso que numa região, ou numa cidade como o Fundão, que é próxima da Covilhã, que tem um clube de primeira divisão, aquela dificuldade de ligação com a comunidade aparece também aqui. Porque é engraçado, e há imensos estudos que falam sobre isso, que as cidades mais pequenas, mas que têm referências muito grandes em termos da prática de uma modalidade, são localidades com um potencial muito grande neste campo. Isso aqui não se tem verificado porque existem poucos clubes. Temos a Desportiva, na Covilhã só recentemente surgiu o projecto da Associação Académica da Universidade da Beira Interior com o Grupo Desportivo da Mata. Ou seja, ainda existe uma dificuldade de identificação com os melhores jogadores, o querer ser como eles. Se nós perguntarmos a alguns miúdos que jogam futsal, eles ainda querem ser como o Cristiano Ronaldo e sonham jogar futebol de 11. Portanto, mais do que a questão da predisposição para o talento, digamos assim, porque essa existe, é necessário criar contextos e agregar esforços para o potenciarmos. E por isso estamos a desenvolver no Departamento de Ciências de Desporto um projeto no âmbito do CIDESD - Centro de Investigação em Desporto, Saúde para potenciar a formação de talentos.
A colaboração entre a AAUBI e o Grupo Desportivo da Mata é então uma mais-valia para a modalidade? Na minha opinião, esse projeto peca por tardio. É fundamental porque permite juntar pessoas que chegam à cidade com um clube com tradição, combinando aqui diferentes forças. Além de desportivamente ser uma mais-valia, para nós, Departamento de Ciências do Desporto (DCD), é também fundamental, porque ajuda na formação dos nossos alunos. Grande parte dos treinadores que estão no GDM-AAUBI são estudantes de Ciências do Desporto que estão a fazer um estágio coordenado por nós. Acabamos por ter competição em formação e temos formação ao nível desportivo dos próprios jogadores e que a partir dela passam também a identificar-se com a UBI, estar nos seus espaços e a querer ficar na UBI para poder jogar nas suas equipas. Temos não apenas uma formação teórica com um grande contributo prático.
Para si, esta oferta desportiva, enquanto elemento do DCD, é importante para atrair alunos para esta área e para a Universidade em si? Considero que esse é cada vez mais um fator diferenciador das instituições. E o desporto, assim como outras actividades sociais e culturais fazem parte das opções ou dos determinantes que levam à escolha por uma determinada universidade. Se nós perguntarmos a muitos dos nossos alunos porque é que vieram estudar para cá, ou porque é que vieram para este curso, eles têm dificuldade em responder. Mas muitos deles já sabem que a UBI tem uma equipa de futsal, ou de basquetebol e que teve bons resultados nessas equipas. Nomeadamente em termos regionais, o impacto aí penso que tem sido muito positivo e cada vez mais me parece que essa é uma aposta que deve ser tida em consideração na captação e desenvolvimento da universidade. Na minha opinião, a UBI e a ADF, fazendo aqui um bocadinho a ponte com aquilo que estávamos a falar há pouco, ou outros clubes que trabalham em rendimento, deveriam aproveitar essas sinergias para ligar o rendimento desportivo com aquilo que pode ser a oferta de um desenvolvimento académico que os jogadores podem ter no futuro. Acho que este é um dos fatores de desenvolvimento que devem ser aproveitados.
Perfil Bruno Travassos tem 33 aos e é natural de Montemor-o-Novo, no distrito de Coimbra. Veio estudar para a Universidade da Beira Interior em 1999 e voltou em 2005 como docente. É casado e tem um filho. No capítulo do treino, foi adjunto da equipa sénior de futsal da Desportiva do Fundão, formação que agora orienta como treinador principal. |
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