Pedaços de Memória

Dos rolos ao digital. Da espera ao instantâneo.
Da impressão ao armazenamento nos computadores.
Das lojas convencionais aos fotógrafos freelancer.
São muitas as mudanças verificadas no mundo da fotografia
que consigo trouxeram novas realidades.


Sara Alves

Ler mais

Se se for ao dicionário, tem-se que é a “arte ou processo de fixar a imagem de qualquer objecto ou realidade através de sensor digital ou superfície fotossensível (película ou chapa) com o auxílio da luz”. Se se quiser algo mais sucinto, pode-se dizer, simplesmente, que significa “desenhar com luz e contraste”. A fotografia é, nos dias de hoje, um fenómeno que está ao alcance de todos, através das mais variadas formas. E, como em qualquer área que se tenha visto invadida pelas novas tecnologias, muito mudou desde o verão de 1826, quando Joseph Nicéphore Niépce, da janela de sua casa, conseguiu fazer aquela que é hoje reconhecida como a primeira fotografia.

Da janela da casa de França para a encosta da Serra da Estrela. Filipe Pinto, José Pereira, Pedro Lopes, Edgar Félix e Tiago Pinheira seguiram os passos do inventor, e também eles começaram a desenhar com a luz e com os contrastes. Mais do que isso: passaram a eternizar memórias, a permitir que se guarde para sempre o que só se vive uma vez. Mas se a paixão é a mesma – a fotografia e o vídeo – as formas de estar ou de pensar não poderiam ser mais distintas. É que se se pensar na fotografia apenas como a gravação de uma imagem, pode-se dizer que nada mudou. Registar um momento através de um click mantém-se.

Contudo, todo o processo até se chegar ao resultado final é totalmente diferente. Trocaram-se os rolos e as impressões pelas máquinas digitais e os computadores. Os avanços tecnológicos permitiram melhorar a qualidade da fotografia, aumentar a resolução e a realidade das cores, criar máquinas mais pequenas e mais fáceis de usar. A internet facilitou o fluxo de imagens. A fotografia tornou-se mais popular e acessível a todos. Abriu horizontes. E se, em tempos, toda a magia se passava nas lojas convencionais, hoje ela está também concentrada bem longe dos estúdios tradicionais.

“O gosto pela fotografia? Já vem de há muito tempo, desde os meus 16 ou 17 anos”

Filipe Pinto, 55 anos, Foto Académica

Filipe Pinto abriu a sua primeira loja de fotografia há cerca de dez anos, mas o começo do seu trabalho na área remonta a 1985. “Eu trabalhava num café e, na altura, já fazia muita fotografia. Andava sempre com a máquina fotográfica e o fotógrafo onde eu mandava revelar as fotografias lá me dizia ‘tu tens jeito’ e começou-me a pedir para ir com ele fazer alguns casamentos”.

E correu bem. Tanto que, numa fase em que precisaram de contratar um fotógrafo, Filipe foi o escolhido. Deixou o café e criou assim uma sociedade. Quando esta terminou, decidiu abrir uma “loja pequenina”, em 1997. Nascia a Foto Académica, agora situada num espaço de maiores dimensões. Diz que gosta de fotografar “praticamente tudo”, desde paisagens a pessoas, e, para além da loja, faz fotografias para jornais a título pessoal, principalmente associadas a eventos desportivos

“São serviços totalmente diferentes, o que não é fácil. É mais fácil fazer fotografia de colóquios, porque está tudo paradinho, e no futebol, futsal ou andebol não. Mas, pronto, há aquele bichinho que a gente tem e, mesmo não sendo, acaba por se tornar”, acrescenta.

“Lembro-me de ficar impressionado com a impressão da imagem, com a revelação do preto e branco”

José Pereira, ILFoto

A história de José Pereira escreve-se por linhas um tanto ou quanto semelhantes. Não é proprietário de uma loja, mas trabalha numa desde 1988, a ILFoto, fundada por dois irmãos dez anos antes. Até aí, foi funcionário numa panificação, altura essa em que já tinha uma máquina e ia fotografando, mas nada que lhe despertasse muito a atenção. “Quando vim para aqui trabalhar, foi mais por uma questão de emprego, só que depois comecei a gostar, acabei por ficar e é a razão pela qual ainda hoje cá estou”.

“Lembro-me de ficar impressionado com a impressão da imagem, com a revelação do preto e branco, quando se revelava na câmara escura e com os químicos. Isso era bastante interessante. A gente aprendia muito com isso, principalmente na área do preto e branco”, relembra. Ter a Serra da Estrela como vizinha acabou também por influenciar o seu gosto pela fotografia. Considerando-se um “amante da natureza”, sempre que pode, aos fins-de-semana, é para lá que vai, seja em que altura for, pois tem sempre alguma coisa nova para explorar: “A Serra da Estrela é propícia para fazer óptimas fotografias, em qualquer uma das quatro estações. Ela tem coisas muito bonitas. Não precisamos de ir para muito longe para fazer fotografias bonitas da natureza”.

Com o passar dos tempos, a fotografia extravasou. Passou, então, a ser de todos e a ser trabalhada de forma diferente. Mudaram-se os tempos e as vontades e novos modelos de negócio surgiram, para lá das paredes das lojas convencionais.

A nova geração

"Já há máquinas que fazem esses serviços de personalização. Acho que as lojas vão desaparecer, pelo menos o conceito que vemos agora. Podem é reabrir como estúdios."

Pedro Lopes / Fotógrafo

"É uma área um bocadinho complicada de gerir, porque é muito sazonal, então temos de ter alguma gestão do volume de trabalho e, obviamente, do dinheiro..."

Tiago Pinheira / Fotógrafo

" Sabemos que tudo isto pode acabar se não nos mexermos, mas eu gosto da responsabilidade acrescida. Sinto que estou a lutar para mim."

Edgar Félix / Videógrafo

Tiago Pinheira, Pedro Lopes e Edgar Felix sabem como tudo mudou. Entusiastas da fotografia desde cedo, fizeram disso um modo de vida e tornaram-se, assim, fotógrafos e videógrafos.

Pedro e Tiago, os fotógrafos, desde cedo tiveram uma ligação próxima com a fotografia. O pai de Pedro tinha um laboratório de revelação em casa e sempre fotografou. O filho tomou-lhe o gosto e no secundário chegou a ganhar um concurso de fotografia. Na hora de ingressar no Ensino Superior, optou pelo curso de Cinema, na Universidade da Beira Interior, visto ter a componente audiovisual. “E depois andava sempre, sempre, sempre com a máquina, até que me começaram a pagar para tirar fotografias e nunca mais pararam de pagar. Agora compro as minhas bolachas com as minhas fotografias”, e muito bem.

Tiago, por sua vez, não tinha ninguém ligado a esta arte, mas desde pequeno que fotografava, pois sempre teve máquinas. Inicialmente, “era daquelas máquinas de brincar, de rolo, que levava para as visitas de estudo da escola”. No secundário, tinha a vontade, o gosto, mas não tinha uma máquina digital para trabalhar. Foi depois de chegar à UBI, ao curso de Design de Multimédia, que comprou uma. Chegou a ter uma cadeira de fotografia que, apesar de ser sobre a analógica, lhe deu algumas bases e permitiu que começasse a perceber melhor o funcionamento das máquinas. Queria experimentar mais, mas a paciência para fazer cursos de fotografia não era muita, então fazia algumas fotografias em eventos que se iam realizando, até que no seu terceiro ano, em 2010/2011, surgiu a oportunidade de começar a trabalhar com a AAUBI. “Eu e mais três ou quatro colegas participamos num open call para fazer cobertura de eventos. Não era ainda com muita qualidade, na altura, mas foi fixe, porque entre todos começamos a aprender, a trocar conhecimentos e acabei por me interessar mesmo a sério e procurar saber um bocadinho mais sobre o funcionamento, a técnica”, recorda.

“Eu entusiasmo-me muito facilmente. Quando era pequeno, só para contextualizar, os meus pais compravam frangos assados sempre no mesmo sítio, e eu ia sempre com eles àquele sítio. Os frangos eram tão bons, e isto é verdade, que eu na escola dizia que queria ser assador de frangos. Aquilo era o melhor. E na Covilhã, a certa altura, começo-me a entusiasmar por uma crescente de fotógrafos, um deles o Pedro, que andava sempre com a câmara atrás e eu pensei ‘isto da fotografia é mesmo porreiro’”, explica Edgar. No segundo ano do curso de Ciências da Comunicação, começou a tirar fotografias, mas a edição de vídeo falava mais alto: “Como eu editava vídeo, optava pelas reportagens de vídeo, no atelier de jornalismo. E como editava, comecei também a trabalhar para o Pedro e para mais fotógrafos. Tudo começou assim”.

Image
Image
Image