Dois modelos de
negócio distintos

Quando se fala na evolução da fotografia, ela não se fica só pelas máquinas fotográficas. O surgimento dos smartphones, que actualmente possuem câmaras com uma boa qualidade de imagem, parece ter vindo descredibilizar o papel do fotógrafo. A ideia do “qualquer um pode fazer isto” instala-se um pouco, mas nem todos acreditam que possa realmente fazer mossa.

“Há essa ideia, porque ficou muito fácil fazer uma fotografia com qualidade de imagem, não puxando aos aspectos técnicos”, explica Tiago Pinheira, “mas se, por um lado, há muita gente que descredibiliza um bocadinho, por outro houve quem começasse a dar mais valor, porque também acontece haver quem tenha bons equipamentos, mas depois os resultados não são os mesmos que conseguem obter através de um fotógrafo profissional”. É o que acontece, por exemplo, quando se fala em casamentos: “Para momentos importantes acho que há uma valorização maior, porque são dias que as pessoas querem viver ao máximo e não querem estar preocupadas com isso. E quererem alguém que se dedique exclusivamente a isso e guarde aquelas memórias para verem mais tarde é sinal de valorização”, conclui.

Dominar os smartphones ao invés de se ser dominado por eles é um dos desafios que se impõe, de forma a fazer cair por terra tal ideia. “Primeiro, o meu trabalho tem de ter um bocadinho mais de valor para a pessoa não achar isso. E cabe a nós aprendermos, conhecermos e avançarmos. A outra vertente é nós tentarmos dominar o smartphone melhor que o comum dos mortais. É fotografarmos, filmarmos e editarmos no smartphone, publicar vídeos, publicar fotos... É dominarmos tanto ou mais do que as pessoas que não estão nesta área”, sugere Edgar Félix.

Para quem trabalha em lojas convencionais, o digital e os telemóveis foram responsáveis por uma quebra no negócio, assim como o custo de vida. Mas há ainda um outro factor: os fotógrafos freelancer. José Pereira adianta: “Nota-se que houve uma quebra nos pedidos para fotografar casamentos, pois, antigamente não havia tanto esses freelancer e as pessoas iam pela qualidade e pela confiança que tinham nos convencionais. Hoje em dia já não acontece, porque sabem que eles têm uma boa máquina, conseguem ver logo as fotografias no momento e, se houver alguma coisa, podem repetir. Isso antes não acontecia. E antigamente as pessoas iam um pouco porque sabiam que ali havia qualidade, ali sabiam fotografar, faziam aquilo durante o ano todo e não era só aos fins-de-semana ou no verão”.

“Não pagam impostos, não pagam nada..É tudo lucro e às vezes tiram-nos muito serviço"

José Pereira, ILFOTO

“Eu não sou contra eles, eles até podem fazer um serviço bom, a questão é que a gente tem uma porta aberta e os impostos ao fim do ano não são tão poucos quanto isso. Temos que trabalhar e fazer alguma coisa para pagá-los, enquanto essas pessoas que aparecem para fazer casamentos não pagam impostos, não pagam nada… é tudo lucro e às vezes tiram-nos muito serviço”, afirma o dono da Foto Académica. E na opinião de José Pereira, muitas das lojas convencionais chegaram mesmo a fechar devido ao aparecimento dos freelancer… e aos impostos: “Hoje em dia, os impostos são tantos que se acaba por pagar mais de impostos do que aquilo que se ganha, o que não se justifica. Então vale mais trabalhar dentro de uma garagem, ter a porta fechada e ter uma loja virtual”.

Para Pedro Lopes, a culpa não está nele e noutros que fazem o mesmo que ele. Está, isso sim, no conformismo. “Acho que um dos grandes problemas foi estarem conformados com o analógico e, de repente, apareceu o digital e eles recusaram. Quando deram conta, o digital era muito superior, eles estavam completamente ultrapassados e já não conseguiram acompanhar. Acho eu. Pelo menos com grande parte foi esse o problema. E acho que a culpa de eles terem ficado para trás é do consumidor, é da procura. Quem começou a procurar, começou a procurar coisas mais personalizadas. Foi democrático”, defende. E Edgar Félix corrobora: “Muito. Não foi nada desleal. Eles nem sequer estão na luta, nem são concorrência. Eles são vendedores”.

Na óptica dos freelancer, a verdade é que o tipo de trabalhos que realizam nada tem a ver com aquele que é oferecido pelas lojas tradicionais. De acordo com Tiago, há muita gente que ainda recorre às lojas quando precisa de fazer fotografias para documentos ou pela vertente dos brindes e das prendas. Também há quem as escolha para fazer as fotografias mais típicas dos seus filhos ainda pequenos, para guardar. “Talvez seja por não terem conhecimento do outro tipo de trabalho ou porque, e reconheço isso, é um trabalho um bocadinho mais caro do que o tradicional. Mas, sinceramente, acho que não há grande conflito. Pelo menos aqui não sinto muito isso, até porque, lá está, acho que não é assim tão comparável em termos da oferta que existe”, diz.

“Acho que a culpa de eles terem ficado para trás é do consumidor”

Pedro Lopes, Fotógrafo

Neste tipo de mercado, não pode haver verdades e, muito menos, absolutas. Para se atingir o sucesso é preciso uma constante adaptação. Os freelancer usufruem ao máximo das vantagens da internet e das redes sociais, estando sempre atentos ao que os consumidores preferem, por exemplo. Já no lado dos convencionais, há quem tenha optado por outras vias, para que o negócio não se perdesse totalmente. “O negócio caiu um bocado, pois o digital deu-nos mais serviços, mas também tirou outros. Não digo que o balanço seja negativo, caso contrário já tinha fechado a porta, mas a fotografia levou um trambolhão muito grande, então comecei a virar-me um bocadinho mais para outros ramos, o dos artigos religiosos, das molduras…”, conta Filipe Pinto.

Assim que se entra na Foto Académica, isto é facilmente verificado. “Na primeira loja também já vendia artigos religiosos, mas não muitos, porque aquela casa sempre os vendeu. Então ficaram lá alguns e depois logo se via”. Quando começou a perceber que a fotografia estava a ficar para trás, devido ao digital, apostou na venda desses produtos mais afincadamente. Não considera que tenha compensado aquilo que perdeu com a fotografia, mas acabou por ser um complemento que se junta ainda aos serviços fotográficos que vai fazendo para alguns jornais.

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