Costumes atravessam gerações na cultura cigana

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A cultura cigana é baseada em três pilares: casamento, luto e leis de apaziguamento, que são normas criadas e transmitidas oralmente por pessoas mais velhas para facilitar o convívio entre as pessoas da mesma etnia. Com o passar dos anos, muitos costumes e tradições foram atualizados ou até mesmo deixaram de existir, mas ainda há alguns que permanecem intactos, como o respeito aos mais velhos.

Um costume que resiste ao tempo é o casamento de acordo com as tradições ciganas. As mulheres da etnia costumam se casar ainda novas, entre os 15 e 17 anos, que é quando começam a se relacionar com os jovens. “Se der uma certa idade na etnia cigana, já é mais difícil casar porque os homens não esperam e querem casar cedo”, resume Deolinda Vicente. Muitos casamentos ainda são acertados entre as famílias, mas hoje existe uma maior liberdade no sentido de ouvir os noivos, saber se eles desejam a união. “Se a rapariga não quiser casar, ela não casa”, afirma Deolinda.

Como não existe namoro na cultura cigana, quando as raparigas começam a se interessar pelos rapazes, já pulam direto para o casamento, ficando noivas. Enquanto não se casam, elas continuam morando com os pais e não podem ter nenhum tipo de contato íntimo com os noivos, como beijos ou, até mesmo, estar perto deles. Entretanto, há aquelas que fogem da tradição e se relacionam com rapazes escondidas dos pais. “Namoram muito por Facebook e telefone”, destaca Carla Sofia Gonçalves.


“O respeito aos mais velhos não muda nunca” 

Deolinda Vicente


A virgindade, por outro lado, ainda é levada a rigor. “Para a etnia cigana é uma vergonha uma rapariga casar e não ser virgem”, afirma Deolinda Vicente. “E tem que mostrar a prova”, ressalta Carla Sofia Gonçalves. Para comprovar, é feito um teste do lençol, com a exibição pública da mancha de sangue provocada pelo rompimento do hímen durante a primeira relação sexual da mulher. Deolinda conta que, se na hora de tirar a prova o rapaz descobrir que a rapariga não é virgem, “ele pode não querer ficar com ela e entregá-la ao pai, dizendo: ‘aqui está a sua filha porque ela não é virgem’”.

Outro costume que costuma ser preservado é a união das mulheres ser apenas com ciganos. “Se for com alguém não cigano, ficamos discriminadas pela família”, conta Carla Sofia Gonçalves. Nesse sentido, é mais fácil o homem casar com uma rapariga não cigana, do que o contrário. Um dos irmãos de Deolinda Vicente, por exemplo, está casado com uma pessoa não cigana e a família a aceita muito bem. De acordo com Deolinda, embora já existam muitas mulheres que se casam com não ciganos, “é bem mais difícil” aceitarem um rapaz sem ser da etnia na família.

Um outro costume que se atualizou é a duração das festas de casamento. Antes, as cerimônias duravam de três a cinco dias, chegando, às vezes, a oito dias de celebração. Hoje, a maioria dos casamentos dura um dia inteiro. “Quem tem mais dinheiro, faz com mais dias”, conta Deolinda Vicente.


Outro pilar muito importante na etnia cigana é o luto. As pessoas dessa etnia acreditam na vida após a morte e seguem vários rituais em homenagem aos mortos. “Temos que respeitar o luto e não vemos televisão durante um ano”, ressalta Carla Sofia Gonçalves. Ainda hoje a duração depende da proximidade com o falecido. O luto pelo marido ou pelo filho, por exemplo, costuma durar a vida inteira da viúva ou da mãe. “Não é igual ao que era antigamente, mas é uma tradição guardada”, avalia Deolinda Vicente, analisando que “os lutos eram muito pesados”.

Antigamente, as mulheres ciganas precisavam vestir roupas pretas e compridas durante anos, cortar o cabelo curto, usar um lenço preto na cabeça e “carregar” o luto para toda a vida. Durante semanas, segundo normas da etnia, nem banho podiam tomar. Já os homens não podiam cortar a barba e tinham que usar chapéus, além do tradicional traje preto. Hoje, muitas mudanças já ocorreram e as regras estão mais flexíveis. “Quem quiser colocar lenço, põe, e quem não quiser, não coloca”, explica Deolinda, dizendo que “veste só a roupa preta e acabou”.


Por outro lado, o respeito aos mais velhos é uma tradição permanente. Na etnia cigana, a idade é sinônimo de sabedoria e conhecimento. Dessa forma, os mais velhos são respeitados pela experiência de vida, sendo os responsáveis por transmitir aos mais jovens os conhecimentos herdados das gerações passadas, na forma das leis de apaziguamento, que regem os valores da etnia cigana. “O respeito aos mais velhos não muda nunca”, enfatiza Deolinda Vicente.

Além do casamento, luto e leis de apaziguamento, a cultura cigana também dá bastante valor à música, dança e canto. Nos últimos anos, esse costume passou a ser fortemente ligado à religião, devido ao aumento das práticas evangélicas entre os ciganos portugueses. As pessoas dessa etnia são, sobretudo, evangélicas - 59,1% delas pertencem à Igreja Evangélica da Filadélfia, segundo o Estudo Nacional sobre as Comunidades Ciganas. O pai de Deolinda Vicente, por exemplo, é pastor evangélico. Com isso, as músicas cantadas pelas pessoas da etnia passaram a ser, sobretudo, no estilo “gospel cigano”

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