Mais do que animais, amigos

 


Mariana Pereira
Beatriz Campos
Inês Lopes

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Hoje em dia, a condição animal é cada vez mais repensada na sociedade. E 2015 foi um marco nesse movimento de preocupação e cuidado com os animais, com a eleição de um deputado do PAN (Pessoas-Animais-Natureza), que se constituiu como o primeiro novo partido da Assembleia da República desde 1999. Esta nova mentalidade, conduziu também a alterações da legislação. E no entanto, o número de animais abandonados e maltratados tem vindo a aumentar. Segundo a Ordem dos Veterinários, em 2017 esse número subiu 22% face ao ano anterior, tendo sido recolhidos nesse ano cerca de 14 mil animais. 


Entregar-se à causa animal

Vítor Costa, vice-presidente da associação de proteção animal Instinto, fundada em 2012 na Covilhã, está há cerca de três anos envolvido nesta causa animal.  A Associação dedica-se à recolha de animais abandonados, contando com o apoio de famílias de acolhimento. Até à data existem 130 animais distribuídos por 70 famílias de acolhimento, como nos diz Vítor Costa.  

Durante o processo que vai desde a recolha à adoção definitiva, a Instinto fornece a estas famílias provisórias todos os tipos de cuidados, como sejam os cuidados veterinários, alimentação, vacinas, entre outros. Porém, o entrevistado também nos revela que há grande dificuldade em providenciar essa ajuda, uma vez que dependem de três pilares: os voluntários (entre 10 a 15), as famílias de acolhimento, e a componente financeira, atendendo a que sobrevivem unicamente de donativos e campanhas de recolha alimentar, não dispondo de qualquer tipo de financiamento público da Câmara Municipal ou das Juntas de freguesia.

Não obstante, dispõem de parcerias com clínicas veterinárias na Covilhã e Castelo Branco.  Apesar de todas as dificuldades que enfrentam no dia a dia, a grande recompensa é poder retirar das ruas cerca de 100 animais por ano. 


O lado público desta causa

Ainda que o modo de atuação seja distinto, o número de resgates feitos pelo Canil Municipal é semelhante ao da Instinto. Hélder Bonifácio, médico veterinário do Canil Municipal da Covilhã, admite que a Instinto “faz uma atividade importante na cidade” e, deste modo, surge como uma entidade que permite aliviar o crescente fluxo de animais que, dia após dias, surgem abandonados. 
O canil, ao constituir-se como um órgão da Câmara Municipal, existe fundamentalmente por uma questão de saúde pública, na medida em que ao permanecerem na via os animais podem representar um perigo para os utentes.

O facto de, no último ano, ter surgido uma lei que proíbe abates nos canis municipais e obriga à esterilização é objeto opiniões muitos díspares. Para Hélder Bonifácio, a filosofia encontra-se correta mas o modo apressado como foi implementada revela uma fraqueza, tendo em conta que “somente daqui a 6 anos é que podemos ter resultados”.  A proibição dos abates, conjugada com o fator da finitude dos espaços, gerou, no canil, uma sobrelotação, pois quando estes estão cheios, não há maneira de reduzir o número de animais e também não há recursos para acolher mais. 

“Infelizmente, as adoções estão a ser feitas cada vez mais lentamente, não atingindo os números pretendidos. É necessário incutir nas pessoas uma maior consciencialização para este problema que afeta toda a comunidade. Se as adoções não aumentarem e, consequentemente, a sobrelotação dos canis conduzir a um número elevado de animais vadios, irá haver um grande problema de saúde pública”.


Animais, um amigo para a vida

Se, por um lado, falamos de maus tratos e abandonos, por outro, não podemos esquecer aqueles que proporcionam aos seus animais de companhia todos os cuidados necessários para o seu bem-estar.
Neste contexto, surge uma cadeia de lojas com cerca de 28 anos, "A Quatro Patas" que fornece aos seus clientes, não só alimentação, acessórios e outras valências, como também um aconselhamento personalizado a fim de obter toda a informação necessária para zelar pela segurança do seu melhor amigo.

Um dos funcionários, David Fernandes, revelou que nesta loja em específico são “muito cuidadosos e exigentes com os cuidados”, dado que os animais aqui comercializados se apresentam como sensíveis pois estão fora do seu habitat natural. Pessoalmente, estes apoiam a Instinto mas a nível de empresa revelam nunca ter sido contactados para parcerias, exceto com a Royal Canin. Esta parceria consistia em ter, na loja, gatos para adoção, cujos custos seriam totalmente suportados até o animal ser, eventualmente, adotado.

Apesar desta iniciativa arrojada, a direção geral de veterinária veio a proibi-la. Ambos os funcionários, Vanessa Fernandes e David Fernandes concordam que deve haver uma atuação da Câmara Municipal no que toca às esterilizações porque mesmo que a adoção de um único animal possa ser considerada uma vitória, acaba, no fundo por ser sempre um retrocesso pois, mesmo que se tire um da rua, outros acabam por nascer.  


A ética animal

Atualmente alguns filósofos, como por exemplo Peter Singer, abordaram este tema. No caso de Singer, nomeadamente por meio do seu livro, Libertação Animal, são discutidos vários conceitos com vista à reflexão, sendo que os animais são seres cientes, ou seja, capazes de sentir dor e prazer, portanto devem ter os seus direitos concedidos de forma igualitária.

Segundo Ana Leonor Santos, professora de Ética na Universidade da Beira Interior, à luz da lei, um dos aspetos mais notáveis é o de deixar de pensar os animais como propriedade, visto que estes são mais do que meros objetos. Verificamos a aplicação desta lei adotada exclusivamente para proteger animais de companhia, através da primeira pena de prisão efetiva a um indivíduo que esventrou uma cadela grávida, em 2016, sendo-lhe aplicada uma pena de prisão de 16 meses.  Contrariamente, temos o reverso da moeda. Uma humanização dos animais, por vezes exagerada.  
Logo, balanceando todos estes aspetos, devemos encontrar um meio termo. Reconhecer a sua essência e não alterar a sua condição como animal.

Créditos
Fotos: Pixabay

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