Voltar à Página da edicao n. 427 de 2008-04-01
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Director: João Canavilhas Director-adjunto: Anabela Gradim
 

Licenciados, emprego e falta dele

> Anabela Gradim

Nem de propósito, o ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Mariano Gago garantiu há dias, na Figueira da Foz, que o número de licenciados em situação de desemprego «é idêntico desde há cinco anos atrás», ou seja, que o número de licenciados inscritos nos centros de emprego permanece constante. Atendendo a que no período em causa se formaram perto de 200 mil pessoas, e que o número daqueles que não encontram trabalho se mantém perto dos 40 mil, conclui o ministro que os novos diplomados que vêm chegando ao mercado de trabalho têm, de modo geral, sido absorvidos por este.

O que não é novidade para ninguém é que Portugal atravessa uma crise de emprego, com uma das taxas mais elevadas da Europa. Com largos sectores do tecido produtivo assentes sobre postos de trabalho pouco qualificados, e com as restrições orçamentais que levaram o Estado – tradicional empregador de muitos dos diplomados do Ensino Superior – a reduzir ao máximo o número de novas admissões, a par do crescimento exponencial de vagas no ensino superior, e consequentemente, do número de graduados, o resultado só podia ser, de facto, um aumento da percepção do desemprego entre os licenciados.

Mas o problema lavra mais fundo que os 40 mil inscritos em Centros de Emprego, e tem a ver com a precariedade de muitos postos de trabalho, com o sub-emprego, com o desempenho de funções indiferenciadas, mas sobretudo, muito mal pagas, ou por vezes nem remuneradas, e com a quantidade dos que emigram para outros países europeus por falta de trabalho adequado às suas qualificações.

Note-se, o número de vagas no Ensino Superior Público cresceu exponenciamente a partir de meados dos anos 90, devido à fórmula de financiamento das universidades. Compreendendo o desencanto que as primeiras dificuldades da vida colocam a uma geração que beneficiou de todos os confortos materiais proporcionados pelo desenvolvimento do País após a sua adesão à União Europeia, e pela queda abrupta da natalidade entretanto verificada, choca-me porém que sempre que o tema faz notícia em jornais com fóruns de comentário aberto, uma das propostas de resolução do problema mais consistentemente apregoada seja o fecho, «por uns anos», de muitos (todos?) cursos de ensino superior.

A «geração rasca», assim apodada por ter mostrado o rabo à então ministra da educação, lutou, e bem, contra o aumento das propinas e pelo fim do numerus clausus, ou seja, pelo aumento de vagas no Ensino Superior. De uma situação em que mais de 50% dos candidatos ficavam à porta das universidades, passou-se rapidamente ao inverso: a existência de mais vagas do que candidatos, o que permitiu a muitos alunos medíocres (durante algum tempo, até reprovados em disciplinas nucleares nos exames nacionais) frequentarem o Ensino Superior.   Choca-me portanto, dizia eu, ver os beneficiários da expansão do Ensino Superior a proporem, precisamente, o inverso: que às gerações abaixo deles seja impedido o acesso à universidade – impedimento esse totalmente artificial porque existe capacidade instalada para a realizar.  Dizer «fechem os cursos» é dizer aos jovens que hoje têm 16, 17 e 18 anos – e entre os quais se contam alunos brilhantes, medianos, e medíocres – que vão engrossar as fileiras de trabalhadores desqualificados. A troco de quê se pode defender isto?

Por muito que aos licenciados que não obtêm emprego isso custe, os problemas da economia portuguesa não se resolvem com regressão, com mais atraso, nem com a desqualificação dos portugueses. No estádio de desenvolvimento do País, e numa economia globalizada, dar a volta por baixo – competir em postos de trabalho desqualificados com a China ou com a Índia – não é mais possível. Preciso é dar a volta por cima, uma espécie de salto tecnológico e civilizacional, e isso, se não é fácil, pelo menos não é impossível.


Data de publicação: 2008-04-01 00:00:00
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