Voltar à Página da edicao n. 423 de 2008-03-04
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Director: João Canavilhas Director-adjunto: Anabela Gradim
 

Emprego por um canudo

> Anabela Gradim

Conforme prometera, o ministério tutelado por Mariano Gago divulgou os números do “desemprego entre licenciados”, ou antes, por escola, e por curso, o número dos que concluíram as suas licenciaturas e se inscreveram num Centro de Emprego à procura de trabalho.
Vale a pena ler o relatório, que se encontra on line na página do ministério, pois este revela algumas surpresas. Por área científica, as que mais desempregados produzem são as Ciências Empresariais, com 16,2% de licenciados desempregados; a formação de professores, com 15,8; as Ciências Sociais e do Comportamento, com 13%; a Engenharia e Técnicas Afins, com 8,4%, seguindo-se as Humanidades, com 6,8%, e a Saúde com 6,2%. Por curso, os que produzem mais desemprego são formações como Psicologia, Serviço Social, Economia, Educação, Enfermagem, e Direito, entre outros.
Por região os números espelham bem o estado de Portugal, e são patente motivo de reflexão: o Norte concentra 46% do total de desempregados do País, e 41% do total de desempregados com habilitação superior, sendo que no Centro estes são 26%, em Lisboa 24,7%, e no Alentejo e Algarve 5,3 e 2,6%, respectivamente.
Por género os números são ainda mais deprimentes: as mulheres perfazem 70,9% dos desempregados com habilitação superior, contra 29,1% do género masculino na mesma situação; uma fatia superior em mais de 10% à das mulheres desempregadas com menor habilitação.
Mas o estudo também mostra que os indivíduos com habilitação superior estão menos sujeitos ao desemprego de longa duração, representando apenas 7,9% dos que procuram trabalho há mais de 24 meses, enquanto sem qualificação superior, nessa situação, são 23,6%. Os jovens licenciados também são quem mais rapidamente obtém, trabalho, demorando em média oito meses, enquanto os não licenciados precisam de entre 12 a 14 meses. Além disso, nos últimos anos, o número de licenciados inscritos nos centros de emprego tem permanecido relativamente constante, quando se sabe que o sistema de Ensino Superior produziu em 2005/2006 cerca de 70 mil diplomados, o que significa que o mercado de trabalho teve capacidade para absorver o aumento de 20% da população com curso superior.
 Na última década, qualificaram-se com habilitação superior 576.090 indivíduos, encontrando-se à procura de emprego 38.204. Foram estas pessoas prejudicadas por terem prosseguido os seus estudos na Universidade? Um diploma só será uma menos-valia quando der acesso a uma situação pior que a daqueles que o não têm. Ora, os números não permitem afirmar nada disso. As remunerações médias de um licenciado são cerca de quatro vezes superiores às de um trabalhador que não tenha frequentado o ensino superior, têm maior facilidade em mudar de emprego, e encontram-se mais protegidos contra o desemprego de longa duração.
Quer isto dizer que Portugal sofre de licenciados a mais, como amiúde se ouve dizer (inclusive da boca dos próprios recém-licenciados)? Dificilmente os números sustentam tal conclusão: Portugal continua a ser o segundo país da OCDE com a menor percentagem de pessoas com formação académica superior, neste parâmetro apenas ultrapassado pela Itália.
Se grassa desemprego entre os diplomados, isso deve-se em boa medida à crise em que o País se encontra mergulhado desde 2000, que se tem reflectido duramente nos números do emprego em geral, agravada pelo facto de o Estado, tradicionalmente empregador de uma boa dose de quadros com formação superior, ter praticamente cessado novos ingressos, com vista a combater o défice.
Ora não é panaceia para tal crise que as universidades coloquem as suas formações ao serviço de um imaginário «mercado de trabalho», como tanto se ouve dizer, até a quem tem responsabilidades na matéria. Mas disso, vocação, financiamento e «formação para o mercado», se falará noutra altura.


Data de publicação: 2008-03-04 00:00:00
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