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> <strong>Alcino Couto</strong><br />

O Poder Económico da Universidade: a comercialização de patentes

> Alcino Couto

Um dos traços mais vincados do processo actual de transformação da universidade é o seu crescente envolvimento em actividades de comercialização de patentes. Mais de uma centena de universidades norte-americanas abraçaram esta nova actividade, bem como universidades canadianas, australianas, da América do Sul e europeias.
Contudo, o patenteamento pela academia dos seus resultados da investigação não é um fenómeno novo na sua história. A sua origem remonta ao início do Século XIX, quando a Wisconsin’ Alumni Foundation recorreu à protecção intelectual de resultados de investigação no domínio agro-biológico e a Universidade de Toronto da descoberta da insulina.
Tais iniciativas não deram, todavia, lugar a uma política articulada e sistemática da universidade de protecção das suas invenções. O que se verificou foi a aquisição por um grupo muito restrito de universidades de experiência neste domínio. O recurso à protecção das invenções foi estando sujeito à apreciação casuística de organizações nacionais como U.S.-based Research Corporation e a Society of Patent Administration (Estado Unidos) e a National Research Development Corporation (Reino Unido).
O Bayh-Dole Act de 1980 introduziu, nos Estados Unidos, uma nova abordagem dos direitos de propriedade intelectual, ao convidar a universidade a assumir responsabilidades pelo patenteamento dos resultados da investigação por si realizada e financiada pelo orçamento público. Em 1985, o Reino Unido produziu iniciativas legislativas de promoção da comercialização dos seus activos intelectuais pela academia. Por sua vez, a União Europeia tem vindo a introduzir, desde 1995, alterações institucionais incentivadoras da comercialização de activos intelectuais, pela universidade. A política da União Europeia é substancialmente reforçada nos VI e VII Programas-Quadro de Investigação e Desenvolvimento Tecnológico e o patenteamento é assumido como vector fundamental da criação dos Espaço Europeu de Investigação e Inovação e da Estratégia de Lisboa; que pretende de tornar a economia europeia na economia baseada no conhecimento mais competitiva do mundo.
A realidade norte-americana e canadiana é aquela que conhece melhor tratamento estatístico. A Association of University Technology Managers (AUTM) elabora relatórios anuais sobre a transferência tecnológica com base nas actividades de estruturas académicas responsáveis pela comercialização de patentes. Os outros países não possuem uma base estatística semelhante.
Desde os anos 80 até 2000 criaram-se cerca de 2922 novas empresas de alta tecnologia. No ano de 1999 foram introduzidos 417 novos produtos. O volume de emprego associado às actividades dinamizadas pela transferência tecnológica ronda os 237.100 postos de trabalho, com elevada incorporação de trabalho qualificado.
No ano de 1999, o investimento, apenas relacionado com a fase de lançamento de projectos empresariais com origem na academia, atinge os 5.1 biliões de dólares norte-americanos. As receitas brutas geradas pelo licenciamento de tecnologias correspondem a 862 milhões de dólares: parte para o financiamento da investigação e do ensino. Finalmente, a receitas fiscais geradas aproximam-se dos 5 biliões de dólares.
A protecção e comercialização de activos intelectuais pela universidade são um tema de acesa polémica na comunidade científica, pois introduz barreiras à livre circulação do conhecimento científico e tecnológico (open science system), um dos princípios estruturantes das norms of science. De facto, tal não deixa de corresponder a uma privatização de um bem público, pela imposição do princípio da exclusão.
Mas esta controvérsia deve-se, em parte, ao insuficiente desenvolvimento teórico dos direitos de propriedade intelectual e à escassa evidência empírica sobre o seu impacte na transformação das invenções em inovações. O problema da protecção parece consistir no grau e na consideração de factores como domínio científico e tecnológico, estádio de desenvolvimento da tecnologia, potencialidades que esta apresenta quanto a linhas de desenvolvimento e aplicação prática, entre outros factores.
No plano económico, a integração da universidade numa política de patentes centrada no início de ciclo de vida dos conhecimentos científico e tecnológico e em pequenas iniciativas de empresarialidade académica constitui um novo vector de política industrial orientado, primordialmente, para a criação de uma competitiva estrutura produtiva do futuro.
Do ponto de vista da política pública, interessa saber se o que move a protecção é a redução da complexa trajectória entre a invenção e a inovação, com claros benefícios sociais e económicos, ou se consiste apenas na procura de uma fonte alternativa de financiamento das universidades. Decerto, visualizam-se estes dois movimentos. Mas o que deve prevalecer como princípio a defender é a magnitude do retorno social líquido (medido em termos de criação de riqueza, emprego, melhor saúde e ambiente, desenvolvimento cultural …) e não o aliviar da pressão orçamental: os rendimentos gerados pela comercialização de patentes tendem a não ultrapassar, nos casos de maior sucesso, os 15% do orçamento de investigação. O financiamento público continuará a constituir o nutriente da investigação universitária.


Data de publicação: 2007-02-06 00:00:00
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