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Jornal Online da UBI, da Região e do RestoDirectora: Anabela Gradim |
Automotoras versus Locomotivas
· quarta, 23 de novembro de 2011 ·
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Como é sabido, na sequência da entrada em funcionamento da electrificação da Linha da Beira Baixa até à cidade da Covilhã, a CP optou e muito bem, pela substituição dos comboios convencionais com locomotiva por unidades triplas eléctricas recentemente remodeladas, a partir do passado dia 1 de Novembro. Todavia, esta alteração tem vindo a ser contestada publicamente de forma individual e através não só de assembleias municipais e de sindicatos mas também de uma associação local de amigos dos caminhos-de-ferro que desconheço (Associação 6 de Setembro), na nossa opinião sem qualquer razão utilizando argumentos bastante discutíveis, provando-se assim mais uma vez que a doença mais grave que afecta a espécie humana é, sem dúvida, a aversão à mudança, leia-se a alteração ao status quo em vigor, mesmo que as novas condições possam ser mais benéficas que as anteriormente existentes. Um outro aspecto psico-sociológico interessante, associado ao comportamento humano, consiste exactamente nas ideias pré-concebidas e no auto-convencimento baseado nessas ideias, que impede a racionalidade do pensamento. Ou seja, um utente que se faça transportar nas novas UTEs e que, à partida, apresente um espírito crítico insensível a alterações de opinião, com toda a certeza que, ao sentir as pequenas vibrações e ruídos característicos, aquando da passagem da composição nas cróssimas das agulhas, transmitirá sempre a ideia categórica de que o novo material circulante é desconfortável, contrariamente a outro utente de espírito aberto, que saberá analisar com uma atitude racional e isenta os pontos fortes e fracos do material. É a mesma situação antagónica de dois indivíduos que nunca provaram uma boa truta do Paul com presunto - o primeiro recusa-se rigidamente a comer porque não gosta e justifica-se que não gosta porque nunca comeu, enquanto que o outro quer comer para formar a sua opinião.
Características dos comboios convencionais
Características das UTEs remodeladas Para melhor entendimento por parte dos nossos leitores, comecemos por caracterizar os comboios em serviço na Linha da Beira Baixa: Até 31 de Outubro de 2011: locomotiva LE5600, de 5600 kW e 220 km/h, 1 carruagem corail (confort+rail) de 1ª classe (bar+passageiros), 2 carruagens corail de 2ª classe. Com início a 1 de Novembro de 2011: Unidade Tripla Eléctrica (UTE) remodelada, da série 2200, de 2000 kW e 120 km/h, constituída por um reboque piloto de 1ª classe, 1 automotora de 2ª classe, e 1 reboque piloto de 2ª classe. Tendo então presente o comboio convencional, o serviço de passageiros realizado com UTEs não é de forma alguma inferior, devido aos seguintes factores: As UTEs remodeladas não são, de forma alguma, comboios do passado (ou “recauchutados”) como tem vindo a ser afirmado de forma gratuita sem conhecimento de causa. Sem dúvida que a sua transformação é excelente sob todos os pontos de vista técnico-económicos, podendo constatar-se que apresentam um conceito de modernidade superior ao das clássicas carruagens corail, e inclusivamente possuem um certificado oficial de qualidade. Convém recordar que as principais características do material ferroviário são a robustez, a fiabilidade, e um longo ciclo de vida útil, que facilmente ultrapassa as cinco décadas para o material eléctrico. Entre muitos mais exemplos, as locomotivas suíças “crocodilo”, assim designadas devido ao seu aspecto, circularam entre 1920 e 1982; as locomotivas francesas da série CoCo7100 tiveram um ciclo de vida que se iniciou em 1952 e terminou em 2001, algumas cumpriram cerca de 8 milhões de quilómetros, e uma outra estabeleceu um recorde absoluto de velocidade em 28 de Março de 1955, com 331 km/h, marca que se manteve até 4 de Setembro de 2006. Por imperativos de ordem económica, que na situação actual não podem nem devem ser desprezados, muitas redes ferroviárias estão já a adoptar unidades múltiplas eléctricas para transporte de passageiros, evitando-se assim o peso morto das locomotivas – basta olhar para os pendulares, TGVs e AGVs, nos quais as automotoras são aproveitadas também para o transporte (nas composições de alta velocidade japoneses todos os seus veículos são automotoras). As acessibilidades foram melhoradas. Os espaços das bagageiras são mais amplos. As casas de banho permitem uma maior mobilidade, por serem mais amplas. Os veículos de 2ª classe são equipados com mesas. Os assentos não são em nada inferiores em conforto aos das carruagens corail. Uma vez que a área da secção recta é superior à das corail, o espaço interior é mais amplo e acolhedor. É disponibilizada rede eléctrica para carga de computadores portáteis e outros acessórios. Dispõem de um sistema de ar condicionado bastante eficiente. O sistema de iluminação é, também ele, bastante eficiente e confortável. O seu nível de conforto não é inferior, antes pelo contrário, ao que é proporcionado por exemplo nos comboios ingleses e noruegueses (enquanto que o Reino Unido, tal como o nosso país, se encontra desindustrializado, a Noruega, que era uma das nações mais pobres da Europa aquando da sua independência do reino da Suécia em 1905, não deixa de ser um país periférico todavia desde há longos anos que é a nação com o mais elevado índice de desenvolvimento humano e a mais pacífica do mundo, tem pleno emprego, cresce a mais de 2% ao ano, o seu PIB per capita é o mais elevado do mundo, o seu fundo de pensões é de 400 mil milhões de euros, não tem praticamente auto-estradas, sem no entanto integrar por opção própria as “tretas” dos G8 e dos G20, nem tão pouco as tragicomédias gregas da Europa dos 27 ou da Zona Euro). Devido à área ocupada pelas suas janelas, superior à das corail, a luminosidade diurna é bastante aprazível. O seu funcionamento é igualmente silencioso, atendendo a que a transmissão eléctrica utiliza motores assíncronos. Como a sua potência e a sua velocidade são significativamente inferiores às das locomotivas LE5600, consegue-se optimizar muito melhor a eficiência energética, uma vez que as velocidades praticadas não ultrapassam 120 km/h e apenas em alguns troços. Poupa-se em energia eléctrica consumida, em tempo e em mão-de-obra nas estações terminais, atendendo a que se suprimem as manobras de inversão das locomotivas. Os custos globais de manutenção são inferiores (1 automotora e 2 reboques, contra 3 carruagens e 1 locomotiva). A sua oferta de transporte é praticamente igual à das composições corail – 185 lugares contra 192 (menos 3,6 %). Considerando lotação completa, enquanto que o comboio tinha um peso total de 229 toneladas (só a locomotiva era responsável por 86 ton.), as UTEs têm apenas 173,3, ou seja menos 24 %. Em termos de eficiência energética, a potência por passageiro é de 11 kW nas UTEs e de 29 kW nos comboios, ou seja, inferior em 62 %. Ainda em termos de eficiência energética, para as mesmas condições físicas de transporte grosso modo a energia consumida é proporcional ao peso dos comboios. Ora, o rácio entre os pesos a plena carga das UTEs e dos comboios é igual a 0,76, o que significa que a poupança de energia situa-se em cerca de 25 %, daí a CP ter afirmado publicamente que prevê uma redução anual de custos de exploração na ordem de 1,5 milhões de euros. No entanto, estamos convictos de que, se se tiver ainda em atenção as poupanças indirectas de exploração, apenas contabilizáveis após o primeiro ano completo de exploração, a poupança global será superior ao número apontado pela CP. |
Comentários:
Comentários: Por lapso, indiquei que a potência nominal das UTEs é de 2000 kW, quando deverá ser 1200 kW, o que as favorece ainda mais em termos de eficiência energética. Por: cabrita@ubi.pt em: s?bado, 26 de novembro de 2011
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