Som analógico
vs. som digital
Há
uns dias um cohecido meu perguntava-me se eu tinha determinada
banda sonora, que ele queria ouvir (the virgin suicides, dos
Air, para os mais curiosos). Eu disse-lhe que sim, que tinha,
mas que era em LP e não em CD. Parecia que tinha falado
em servo-croata. "Em disco? Mas... em vinil? Isso ainda
existe?". Pois é, para espanto do tal rapaz e para
espanto se calhar de alguns dos leitores deste texto, o vinil
não só não morreu como recomenda-se mais
do que nunca. Actualmente quase todas as bandas estrangeiras
editam os seus álbuns em vinil, ao mesmo tempo que a edição
em CD, obviamente. Óptimo. Bandas portuguesas, quase nada.
Que eu tenha conhecimento só mesmo os Belle Chase Hotel.
No entanto a 'moda' parece estar a pegar pois cada vez mais pessoas
parecem estar a aderir (pela primeira vez ou de novo) ao vinil.
Cabe aqui uma explicação
sumária das diferenças entre o som analógico
(presente, por exemplo, num disco em vinil) e o som digital (presente,
por exemplo, num CD.) Sumária pois não é
aqui o local apropriado para me alongar e, temo, por não
ser um especialista na matéria.
O som é uma onda, ou melhor um conjunto de ondas que atravessam
o espaço. Essas ondas são medidas em hertz, inicialmente,
mas para o caso em kilohertz (kHz). O som vai, em termos leigos,
de muito grave a muito agudo. A distância que vai do som
mais agudo ao mais grave é gigantesca. Seja só
voz humana ou uma orquestra de 200 pessoas, uma gravação
áudio contém uma quantidade enorme de informação.
Esta informação reporta-se a uma amplitude sonora
IMENSA, e só estou a falar daquela que os humanos captam,
que não é toda. Um disco em vinil, quando prensado
numa boa fábrica e cujo material sonoro venha de boas
fitas analógicas, contém TODA essa informação.
Toda. Por isso, quando se ouve um bom vinil ouve-se TUDO o que
a banda gravou. Tudo o que eles ou elas queriam que nós
ouvissemos. Um mau vinil terá praticamente tudo também,
simplesmente não com a clareza e o brilho original. Eis
o som analógico. E o som digital? Bem, por 'digital',
e neste caso específico, compreende-se informação
processada informaticamente e convertida em linguagem binária
(zeros e uns). Acontece que a informação ocupa
ESPAÇO e a informação áudio ou vídeo
ocupa mesmo MUITO espaço. Nos finais dos anos 70 os engenheiros
da Phillips (holandesa) e da Sony (japonesa) tentavam desenvolver
um sistema sonoro baseado num medium que fosse mais pequeno
que o LP, comportasse tantos ou mais minutos de música
e que cuja produção ficasse barata. Assim desenvolveram,
mais ou menos a meias, o CD (compact-disc, o nome diz tudo),
um suporte que permitia conter até 74 minutos de música
com uma qualidade, afirmavam, perfeita, e melhor ainda, eterna.
Tinhamos portanto som altamente e prá vida toda. Os primeiros
anúncios para televisão aos CD's reforçavam
esta mensagem até ao absurdo, colocando um cão
a apanhar, com os dentes, um CD atirado pelo dono. Este colocava-o
a seguir no leitor e o CD estava impecável. :)
Mas o que faz o CD (ou melhor,
o som digital) ser pior que o vinil? Bem, a questão é
até bastante simples: o mapa não é o território.
O som, como foi referido atrás, é quase infinito
na sua amplitude. A informação digitalizada em
0's e 1's não pode conter toda essa informação
porque se o fizesse cada CD levaria meia dúzia de minutos
de música. Assim sendo, o que é feita é
uma AMOSTRAGEM digital, isto é, selecionam uma amplitude
determinada (no caso do CD, 44 ou 48 kHz) e é só
isso que vai parar ao CD. Tudo o resto é cortado. Tudo
o resto. Assim, não admira que, em casos como o álbum
criticado esta semana, 'OK Computer' dos Radiohead, tenhamos
mais sons no vinil do que no CD. Tão simples quanto isso.
Seja como for, o mais usual é não faltarem sons
nas músicas, mas antes a sensação que fica
no ouvinte perante os dois suportes. Os seres humanos, até
prova em contrário, são analógicos, não
são 'digitais', e por isso reagem melhor ao som analógico.
Se ouvir o mesmo álbum, nas mesmas condições
e com material de igual qualidade, muito provavelmente preferirá
ouvir em vinil. Testes 'cegos' (isto é, sem que os testados
soubessem qual era o CD e qual o vinil) tiveram os resultados
que se esperaria - a grande maioria das pessoas prefere o vinil.
O som em vinil é quase sempre descrito como mais 'quente'
e mais 'profundo'. O som digital, quando comparado com o analógico,
é descrito usualmente como mais 'frio' e 'linear'. Num
outro teste, feito em discotecas americanas, foi descoberto que
os clientes ficavam até mais tarde naquelas em que eram
utilizados discos em vinil em vez de CD's. A razão para
isto é que de facto os 48 kHz da amostragem que é
feita não chegam, pois não atingem as frequências
mais altas e mais baixas, ficando-se pelas centrais. As frequências
mais baixas (graves) são muitas vezes inaudíveis
mas MEXEM connosco, definem a percepção do som,
e ficar sem elas é não ter o quadro todo à
nossa frente.
Por fim, e apesar de ser uma
razão talvez menor, há que referir o trabalho gráfico.
Um LP é ENORME, e a capa do disco é GRANDE. As
fotos dos ídolos são MAIORES e as letras não
ficam em corpo 8! Em relação à aquisição
de gira-discos e dos discos em si, o cenário está
cada vez melhor. Algumas das megastores em Lisboa e Porto já
começam a ter (e encomendam se o cliente pedir) as edições
em vinil dos álbuns que vão saindo. Existem ainda
lojas da especialidade, mas só nas grandes cidades. Quem
tiver acesso à internet e um cartão de crédito,
só precisa de ter dinheiro na conta. A maior parte das
grandes lojas on-line tem uma secção bem recheada
de vinil e existem, claro sites epecializados. Em relação
ao 'hardware' :), está disponível nas lojas de
alta-fidelidade (se bem que num hipermercado pode comprar um
gira-discos sony por 15 contos), de 50 contos até ao infinito.
Se, tal como eu, não tiver ouvido de purista, qualquer
gira-discos de qualidade serve. O meu é o da foto, custa
80 contos e é uma BOMBA! O mercado em segunda mão
também é para ter em conta, pois arranjam-se gira-discos
clássicos EXCELENTES a uma parcela do preço que
valem. Se depois de tudo isto não ficou convencido, ÓPTIMO!
O vinil de facto não presta e tudo o que tem a fazer é
dar-me todos os LP's que tiver aí em casa que eu vou busca-los
de borla. Sou amiguinho ou não sou? |